quinta-feira, 22 de novembro de 2012

MEDICAMENTOS ANTI - INFECCIOSOS PARTE 1

FORMULÁRIO HOSPITALAR NACIONAL DE MEDICAMENTOS



MEDICAMENTOS ANTI - INFECCIOSOS
PARTE 1

INTRODUÇÃO

A prescrição de um antimicrobiano pode ser um dos mais complexos atos da terapêutica medicamentosa pelas variáveis envolvidas, onde avulta a trilogia: agente, com a sua sensibilidade específica e inata ao fármaco, que se pode modificar por vários processos de resistência adquirida; hospedeiro, com fatores fundamentais como: o local da infecção e grau e tipo da resposta imunológica à infecção, sendo também a qualidade das funções hepática e renal decisivas para a farmacocinética do antimicrobiano; e o fármaco, cujas estruturas, cinética e parâmetros de atividade, são determinantes para a escolha correta da via de administração, doses e intervalo das mesmas.

As infecções no homem podem ser causadas por diversos microrganismos (bactérias, vírus, fungos, parasitas) e podem ser não aparentes, sub clínicas ou manifestarem-se sob a forma de doença. A doença infecciosa depende da interação agente - hospedeiro e pode evoluir espontaneamente para a cura, ou progredir com vários graus de morbidade e mortalidade. As doenças infecciosas de expressão clínica grave, são mais da responsabilidade do hospedeiro do que do agente, deverão ser tratadas em meio hospitalar, não só para monitorização, como para eventual administração da terapêutica antibiótica adequada, nomeadamente por via parenteral.

O advento dos primeiros antibióticos há pouco mais de 50 anos, iniciou um período em que se tornou possível tratar eficazmente muitas doenças infecciosas bacterianas, contribuindo para uma clara melhoria na saúde, pública (controle de endemias e epidemias) e individual (redução de morbidade, mortalidade e também das seqüelas). Apesar do aumento do número de antimicrobianos disponíveis, não foi possível a erradicação total das doenças infecciosas, nem é previsível que o seja.

Com efeito, a par do conhecimento de novos agentes infectantes e do ressurgimento de velhas doenças infecciosas, de há muito é reconhecida a capacidade de os microrganismos adquirirem resistências a fármacos que anteriormente eram sensíveis, transformando as certezas terapêuticas de ontem e hoje em incertezas de hoje e amanhã.

Esta alteração no ecossistema microbiológico, nomeadamente em nível das bactérias, é, sobretudo evidente em meio hospitalar, devido às prescrições intensivas, e muitas vezes imponderadas, de antibióticos.

São exemplo disso a utilização seqüencial e prolongada de antibióticos diferentes ou a opção desnecessária por esquemas de largo espectro, em associação ou em monoterapia. A infecção hospitalar é uma preocupação crescente para todos os profissionais e sistemas de saúde. A sua dimensão e gravidade tornam indispensável uma gestão sensata dos diferentes antimicrobianos disponíveis.

É bem conhecido que cada hospital tem a sua flora bacteriana própria, nomeadamente no respeitante ao padrão de sensibilidade aos antibióticos, estando este fato muito ligado à forma e intensidade com que estes são utilizados. Em dois hospitais diferentes, e também em diferentes serviços do mesmo hospital, uma estirpe pode ser resistente a um determinado antibiótico num deles e sensível no outro.

Esta circunstância, porém, se por um lado legítima uma maior flexibilidade na escolha medicamentosa, não legítima a inclusão, num formulário hospitalar da totalidade de antimicrobianos de todos os grupos. Salvaguardadas que estejam às opções terapêuticas para a generalidade das infecções diagnosticadas nos hospitais, é suficiente e sensato que nele constem os considerados de referência dentro de cada grupo, que possam ser úteis à diversidade habitual daquelas situações clínicas e cuja eficácia seja reconhecida pela experiência.

ANTIBACTERIANOS

Os antibióticos lactâmicos beta possuem mecanismos de ação e efeitos adversos semelhantes, diferindo nas suas propriedades farmacocinéticas e no seu espectro de ação. Tem em comum um anel lactâmico beta e, com base na sua estrutura química, podem estabelecer-se quatro subgrupos:

1.    Penicilinas,
2.    Cefalosporinas,
3.    Monobactâmicos e
4.    Carbapenêmicos.

PENICILINAS

As penicilinas foram os primeiros antimicrobianos usados na terapêutica; de origem natural ou sintética, são amplamente utilizadas para maioria das infecções.
São bactericidas e interferem na síntese da parede celular bacteriana. Distribuem-se amplamente no organismo, mas a penetração no sistema nervoso central e pequena, exceto quando as meninges estão inflamadas. Geralmente são bem toleradas; os efeitos adversos mais importantes são as reações de hipersensibilidade. Reações alérgicas a penicilinas ocorrem em 1% a 10% dos pacientes tratados, enquanto as reações de anafilaxia, em menos de 0,05%, Deve-se investigar a historia previa de reações alérgicas como forma de prevenir a ocorrência de reações de hipersensibilidade.

Considerando a resistência à acidez gástrica e, bem como o seu espectro de ação, é tradicional dividir as penicilinas em 5 grupos:

Benzilpenicilina e Fenoximetilpenicilina,
Aminopenicilinas,
Isoxazolilpenicilinas,
Carboxipenicilinas e
Ureidopenicilinas.

1 - BENZILPENICILINA E FENOXIMETILPENICILINA

A atividade da benzilpenicilina (penicilina G) sobre as bactérias que lhe são sensíveis é extremamente rápida e eficaz, sendo este o menos tóxico de todos os antibióticos. Continua a ser o agente de primeira escolha na maioria das infecções provocadas por espiroquetas e cocos (com exceção dos estafilococos).

As formas de ação prolongada (benzilpenicilina benzatínica e benzilpenicilina procaínica) não permitem obter concentrações sanguíneas e tecidulares tão elevadas para uma determinada dose, nem devem ser administradas em doses tão elevadas como as possíveis com a benzilpenicilina.

Devem, por isso, ser reservadas para o tratamento de infecções por bactérias bastante sensíveis (concentrações inibitórias mínimas muito baixas) e em regimes profiláticos.

A fenoximetilpenicilina ( penicilina V) é resistente à acidez gástrica e ministrável por via oral; possui um espectro de ação semelhante ao da benzilpenicilina, sendo no entanto menos ativa contra o gonococo.

2 - AMINOPENICILINAS

São penicilinas resistentes aos ácidos e com espectro de ação em grande parte sobreponível ao da benzilpenicilina. No entanto, perdem a ação que esta tem sobre os anaeróbios, enquanto que a adquirem em relação a algumas bactérias Gram-negativo ( H. influenzae, E. coli, P. mirabilis).

Os elementos deste grupo têm o mesmo espectro de ação, existindo apenas diferenças na biodisponibilidade por via oral.

A ampicilina é menos bem absorvida que a amoxicilina, pelo que esta deve ser preferida sempre que se utilize esta via de administração (exceto nas infecções provocadas por Shigella).

Dado que as aminopenicilinas são sensíveis às lactamases beta, existem associações de amoxicilina com um inibidor daquelas (ácido clavulânico), no sentido de recuperar alguma ação sobre bactérias Gram-negativas produtoras de lactamase beta.

Esta associação, no entanto, tem mais efeitos secundários gastrointestinais e impede que se possa aumentar a dose de amoxicilina, como é atualmente preconizado nas infecções pneumocócicas. Nestas, portanto, deve sempre ser utilizada a amoxicilina simples.

3 - ISOXAZOLILPENICILINAS

São penicilinas resistentes aos ácidos e às penicilinases (ex: flucloxacilina). São ativas por via oral e devem usar-se, exclusivamente no tratamento de infecções causadas por estafilococos produtores de penicilinases. Em infecções graves deve recorrer-se à via parentérica, pelo menos no início do tratamento.

4 - UREIDOPENICILINAS

Algumas classificações, em textos de referência, englobam as ureidopenicilinas e as carboxipenicilinas como penicilinas anti-pseudomonas.

São três as ureidopenicilinas mais conhecidas: azlocilina, mezlocilina e piperacilina. Têm um espectro de ação relativamente alargado em relação às bactérias Gram-negativo. A piperacilina é aquela de que se tem maior experiência. Quando associada a um aminoglicosídeo tem boa eficácia terapêutica nas infecções provocadas por pseudomonas que tenham este padrão de sensibilidade. Existe no mercado a associação da piperacilina com um inibidor de lactamases beta (tazobactam), com resultados clínicos idênticos aos da piperacilina isolada.

CEFALOSPORINAS

São vários os antibióticos lactâmicos beta pertencentes a este grupo, com características farmacoterapêuticas semelhantes.

As cefalosporinas de 1a geração têm um espectro de ação relativamente próximo do das aminopenicilinas (boa atividade contra as bactérias Gram-positivo, incluindo o estafilococo) e são mais resistentes à hidrólise pelas lactamases beta.

Algumas cefalosporinas de 1a geração são sensíveis aos ácidos, como a cefalotina e a cefazolina, pelo que não podem ser administradas por via oral. Outras são resistentes, podendo por isso ser administradas por aquela via (cefalexina, cefradina).

As cefalosporinas de 2geração, comparadas com as de 1ª, perdem atividade em relação às bactérias Gram-positivo mas aumentam a atividade contra bactérias Gram-negativo. Embora a cefoxitina, o cefotetano e o cefmetazole sejam cefamicinas, com modificações na estrutura da cefalosporina, tem um espectro de ação sobreponível às cefalosporinas de 2a geração, acrescido de ação sobre anaeróbios, incluindo o Bacteroides fragilis.

As cefalosporinas de 3a geração alargam ainda mais o espectro de ação em relação às bactérias Gram-negativo, uma vez que são mais resistentes à hidrólise por lactamases beta de enterobacteriáceas nomeadamente. As indicações do seu uso são, por isso, praticamente reservadas a meio hospitalar.

Apesar de terem um comportamento de grupo há, no entanto, algumas diferenças que justificam a presença de três representantes neste formulário: - a ceftazidima é a mais eficaz contra a Ps. aeroginosa. - a cefotaxima é a mais indicada para utilização nos recém-nascidos, por não interferir com o metabolismo da bilirrubina. - a ceftriaxona tem um espectro de atividade idêntico à cefotaxima, mas com uma semivida bastante maior, o que permite reduzir o número de administrações diárias (uma ou duas).

Outras cefalosporinas, de aparecimento posterior, consideradas por alguns autores como de 4a geração, não demonstraram qualquer vantagem em relação às necessidades hospitalares.

MONOBACTÂMICO

O único antibiótico monobactâmico disponível para uso terapêutico é o aztreonam, que é o primeiro lactâmico beta com uma ação exclusiva contra bactérias Gram-negativo aeróbias. Não provou ter vantagens em relação a outros antibióticos com o mesmo espectro.

CARBAPENÊMICOS

Os carbapenemes têm um espectro de ação muito alargado, quer sobre a maior parte das bactérias Gram-positivo (excluindo os estafilococos meticilina-resistentes), quer sobre as Gram-negativo (incluindo pseudomonas), aeróbias e anaeróbias. Não têm ação sobre riquetsias, legionelas, clamídias e Ps. maltophilia.

O primeiro carbapeneme disponível para uso clínico foi o imipenem. Encontra-se associado na relação de 1:1 com a cilastatina, que impede a sua inactivação, ao inibir a di-hidropeptidase I (enzima renal).

O meropenem tem, in vitro, atividade semelhante à do imipenem. Difere deste por ser estável à di-hidropeptidase I e atravessar a barreira hematoencefálica. O ertapenem, dotado de uma maior semivida, tem um espectro de ação um pouco mais estreito que os anteriores, tendo menor atividade que o imipenem sobre a generalidade dos agentes aeróbios Gram-positivo (e, praticamente, ausência de atividade sobre enterococos), não tendo ainda atividade relevante sobre pseudomonas.

Dentro das reações adversas deste grupo de antibióticos, é de referir as relacionadas com o Sistema Nervoso Central (SNC), nomeadamente convulsões, sendo maior o risco em doentes com patologia a esse nível, anterior ou concomitante (traumatismo craniano, neurocirurgia, ou história prévia de convulsões). A referência acumulada destes episódios é superior em relação ao imipenem (embora inferiores a 1%), o que pode ser devido ao seu maior tempo de utilização.

CLORANFENICOL E TETRACICLINAS

O cloranfenicol tem características farmacocinéticas que lhe permitem atingir concentrações elevadas em determinados focos de infecção pelo que, apesar do receio da sua toxicidade hematológica, continua a estar entre os de primeira escolha no tratamento de abscessos cerebrais por anaeróbios, febre tifóide ou sempre que uma febre escaro-nodular necessite de terapêutica intravenosa. Todas as tetraciclinas atuais pelo mesmo mecanismo têm um espectro de ação semelhante e resistência cruzada entre elas.

Distinguem-se umas das outras nas características farmacocinéticas, sendo a doxiciclina aquela que apresenta características mais favoráveis: é a melhor absorvida por via digestiva e a menos afetada na sua absorção pela presença de alimentos; tem uma semivida mais longa, o que permite uma a duas administrações por dia. Além disso, como é apenas fracamente excretada por via renal, pode ser administrada a doente com qualquer grau de insuficiência renal. As tetraciclinas são antibióticos de primeira escolha no tratamento da Cólera, da Peste, da Brucelose, das Riquetsioses e no tratamento das infecções por Chlamydia e por Mycoplasma.

AMINOGLICOSÍDEOS

Os aminoglicosídeos, antibióticos bactericidas, mantêm uma excelente atividade contra a maioria dos microrganismos Gram- negativo aeróbios ( Klebsiella, Serratia, Enterobacter, Pseudomona) e, ainda, contra o Staphylococcus aureus. Apesar do aumento das resistências dos microrganismos aos antibióticos alternativos (cefalosporinas, fluoroquinolonas) os aminoglicosídeos mantêm a sua utilidade clínica. Não são absorvidos por via oral e têm como inconveniente nefro e ototoxicidade e efeitos curarizantes.

A estreptomicina é o mais antigo e melhor estudado dos aminoglicosídeos. Tem indicação no tratamento da tuberculose (tal como a canamicina) e na brucelose, neste caso em associação com uma tetraciclina. A gentamicina, a netilmicina, a tobramicina e a amicacina são os mais largamente utilizados. Usam-se no tratamento inicial de quadros sépticos graves, particularmente em infecções nosocomiais, em combinação com antibióticos lactâmicos beta. O momento oportuno da utilização desta associação é a fase bacteriémica, em que o agente se encontra no sangue.

Embora com significado clínico incerto, a tobramicina tem, in vitro, maior atividade que a gentamicina sobre Pseudomonas aeruginosa e menor em relação à Serratia spp. Esta ação da tobramicina sobre P. aeruginosa motivou a sua utilização, por via inalatória, para controlo das repetidas infecções em doentes com fibrose cística. Não está ainda provada vantagem em relação ao antibiótico de referência usado para este fim (colistina), pois, embora em curto prazo a eficácia bacteriológica seja semelhante, tem mais relações adversas e maior promoção de resistências.

A amicacina, comparativamente com os outros, tem tido menor aumento de resistências. Como se referiu, são todos potencialmente nefrotóxicos, com exceção da estreptomicina, que é fundamentalmente ototóxica. Assim, a sua utilização deve revestir-se dos cuidados inerentes, sobretudo uma boa hidratação do doente, devendo recorrer-se à monitorização das concentrações séricas nos doentes de maior risco, a fim de garantir doses úteis em circulação; são o caso dos portadores de insuficiência renal avançada onde as doses parciais e seus intervalos se calculam em função do débito do filtrado glomerular.

MACRÓLIDEOS

Os macrólideos disponíveis, apesar de algumas diferenças de pequena relevância clínica, nomeadamente em meio hospitalar, são um grupo de antibióticos bastante homogêneos, no que diz respeito ao seu espectro de ação e indução de resistências, que é sempre cruzada. Têm como referência a eritromicina, o primeiro macrólido a ser introduzido para uso clínico, que tem sido largamente utilizada, como alternativa à benzilpenicilina no tratamento de infecções estreptocócicas e diftéricas.

São ainda alternativas às tetraciclinas no tratamento de infecções por agentes atípicos, como Mycoplasma e Chlamydia. São de 1 linha contra Legionella, nomeadamente L. pneumophila. O seu espectro de ação abrange ainda outros agentes com interesse clínico, tais como Haemophilus influenzae, H. ducreyi, Campylobacter e Moraxella catarrhalis, entre outros.

A claritromicina, derivado semissintético, tem maior semivida que a eritromicina. É ativa sobre micobactérias atípicas, nomeadamente M. avium. A azitromicina, outro derivado semissintético, tem ainda uma maior semivida, permitindo uma única administração diária. Tem alguma maior eficácia do que os anteriores em relação a H. influenzae, mas menor que a eritromicina em relação a cocos Gram-positivo, nomeadamente estafilococos e estreptococos.

Globalmente, tem-se verificado, em relação aos macrólidos, um aumento crescente de resistências por parte dos agentes etiológicos mais comuns das pneumonias primárias (pneumococo e H. influenzae), pelo que a sua introdução em protocolos de terapêutica empírica nestas situações deve ser bem ponderado. Como relações adversas mais comuns, nomeadamente em relação à eritromicina, os macrólidos, por via oral, podem originar sintomas de intolerância gastrointestinal. Deve ainda referir-se que estes fármacos, nomeadamente os primeiros (eritromicina e tetraciclina), podem ocasionar internações clinicamente relevantes, com teofilina, digoxina, varfarina e carbamazepina, entre outros.

FONTE

INFARMED Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P de Portugal http://www.infarmed.pt/portal/page/portal/INFARMED




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