ATENÇÃO FARMACÊUTICA: CONCEITO E DESAFIOS
Centro Universitário Newton Paiva, Juliana Leandro de Barros, Tayane
Oliveira do Santos, Atenção Farmacêutica:Conceito e desafios, Belo Horizonte, 2008
Projeto de Monografia apresentado ao Curso de Graduação de Farmácia
do Centro Universitário Newton Paiva, como requisito parcial à obtenção de crédito
na disciplina de Leitura e Produção de texto Científico.
Orientadora: Daniela Machado. Belo Horizonte.2008
RESUMO
A Atenção Farmacêutica, prática relativamente recente no Brasil e
no mundo, pode se entendida como um atendimento diferenciado do farmacêutico com
o paciente. Individualidade, monitoração da farmacoterapia e o uso racional de medicamentos
são algumas das características atribuídas à essa prática.
A implantação da Atenção Farmacêutica encontra dificuldades em diversos
aspectos como, por exemplo, o desinteresse dos proprietários de farmácias e dos
próprios farmacêuticos, a necessidade de uma infra-estrutura adequada e a disponibilidade
do profissional em tempo integral.
A partir disso, foi realizada uma revisão de literatura seguida de
uma pesquisa de campo, na qual elaborou-se questionário destinado a farmacêuticos
em farmácias comunitárias privadas, com intuito de conhecer um pouco sobre a realidade
da Atenção Farmacêutica no município de Belo Horizonte. Os resultados obtidos demonstram
que a implantação dessa prática profissional é complexa, devido ao desconhecimento
da prática, à necessidade de ambiente adequado e o desinteresse dos proprietários
dos estabelecimentos farmacêuticos.
Assim, observou-se a importância de mobilizar os farmacêuticos para
divulgação e difusão da implantação da Atenção Farmacêutica, a começar pela própria
conscientização dos profissionais e empresários, já que ela contribui para a promoção
da saúde.
Palavras-chaves: Atenção Farmacêutica; implantação
da Atenção Farmacêutica; Promoção da Saúde.
1. INTRODUÇÃO
O medicamento é importante para a melhora da saúde, entretanto sua
eficácia depende, dentre outros fatores, do seu uso racional 2 cuja
orientação é realizada pelo farmacêutico. Esse profissional, por sua vez, deve realizar
atividades vinculadas à promoção da saúde, tendo em vista o bem-estar do paciente. A recente
prática profissional da Atenção Farmacêutica é um importante instrumento na promoção
da saúde já que nela, o paciente é o principal beneficiário das ações do farmacêutico. 3
Para efetivar essa atividade, os profissionais farmacêuticos precisam,
antes de qualquer coisa, conhecimento ou atualização nessa nova prática e dispor
de fontes de informação independente e imparcial sobre medicamentos. 4 É preciso que os proprietários de farmácias
comunitárias, em especial, tomem consciência da necessidade de implantá-la em seu
estabelecimento, e criem um ambiente adequado para a execução desta atividade.
Atualmente, a farmácia comunitária é vista como um comércio e não
como um estabelecimento de saúde. Quando presente, na maioria das vezes, o farmacêutico
acumula funções gerenciais , burocráticas 4 e administrativas, assim não lhe sobra tempo
para atender os pacientes de forma completa que seria a prestação de não apenas
uma orientação de balcão, mas também a Atenção Farmacêutica.
Na condição de estabelecimento que integra os sistemas de saúde,
a farmácia comunitária apresenta vantagens, tais como: fácil acesso a um profissional
de saúde; condições adequadas para participação em campanhas sanitárias; redução
de gastos com tratamentos, por possibilitar intervenção primária e encaminhamento
à assistência médica; aumento na observância à terapêutica farmacológica prescrita,4 com conseqüente melhora na qualidade de vida
do usuário.
O farmacêutico, mais do que nunca, tem um papel importante junto
à construção de um novo modelo de atenção à saúde, onde ele possa estar inserido
como profissional do medicamento, atuando como referência na orientação, cumprimento,
acompanhamento e monitoramento da terapia farmacológica.
2. OBJETIVO
2.1. Objetivo Geral
Conceituar Atenção Farmacêutica e conhecer a atuação do farmacêutico
neste contexto, verificando seus desafios.
2.2. Objetivos Específicos
1. Conceituar Atenção Farmacêutica;
2. Conceituar Promoção da Saúde,
relacionando à Atenção Farmacêutica;
3. Descrever atividades pertinentes
à Atenção Farmacêutica;
4. Demonstrar se a realidade
permite a implantação da Atenção Farmacêutica, através de revisão de literatura
e pesquisa de campo;
5. Elaborar um questionário
para realização de entrevistas com farmacêuticos que trabalhem em farmácias comunitárias;
6. Conhecer as atividades desempenhadas
pelo farmacêutico na Atenção Farmacêutica;
7. Avaliar os farmacêuticos
enquanto prestadores ou possíveis prestadores da Atenção Farmacêutica.
3. METODOLOGIA
A Metodologia empregada no estudo a respeito de Atenção Farmacêutica
iniciou-se, num primeiro momento, com uma revisão de literatura em sítios consagrados
como Scielo e Ministério da Saúde (ANVISA) que visou um conhecimento básico sobre
o assunto, incluindo conceito e práticas pertinentes ao exercício da Atenção Farmacêutica,
além de verificar a importância do profissional farmacêutico na promoção da saúde.
A partir desse conhecimento,baseando-se no artigo científico “Obstáculos
da atenção farmacêutica no Brasil”5 foi preparado um questionário (Apêndice 1) com
dez perguntas a serem realizadas para farmacêuticos que atuam em farmácias comunitárias
a fim de avaliar sua satisfação enquanto profissional atuante nessa área e questionar
a respeito da implantação da Atenção Farmacêutica nestas.
A terceira etapa foi reunir os resultados com a finalidade de organizar
os dados coletados e compará-los analisando as conclusões da pesquisa de campo.
Concluída esta etapa, finalizou-se a revisão de literatura, inserindo novos conteúdos,
comentários e conhecimentos adquiridos na pesquisa de campo. E assim foi possível
formular nossas próprias conclusões e considerações sobre o assunto.
4. REVISÃO DE LITERATURA
4.1.Cconceitos de Atenção Farmacêutica
A Atenção Farmacêutica, prática desempenhada pelo farmacêutico, foi
inserida, de certo modo, recentemente na Assistência Farmacêutica. O termo Atenção
Farmacêutica foi utilizado pela primeira vez por Mikeal (1975) como sendo “[...] a assistência que um determinado paciente
necessita e recebe, que assegura um uso seguro e racional de medicamentos.” 3
Posteriormente, em publicações de ciências farmacêuticas, a primeira
definição de atenção farmacêutica surgiu em um artigo publicado por Brodie et al
(1980):
[...] em um sistema de saúde, o componente medicamento é estruturado
para fornecer um padrão aceitável de atenção farmacêutica para pacientes ambulatoriais
e internados. Atenção farmacêutica inclui a definição das necessidades farmacoterápicas
do indivíduo e o fornecimento não apenas dos medicamentos necessários, mas também
os serviços para garantir uma terapia segura e efetiva. Incluindo mecanismos de
controle que facilitem a continuidade da assistência. 6
O conceito clássico dessa prática, formulado por Hepler & Strand
(1990), baseia-se na responsabilidade farmacoterapêutica orientada com o objetivo
de melhorar a qualidade de vida dos pacientes, atingindo, assim a promoção da saúde
através da cura de uma doença; eliminação ou redução dos sintomas do paciente; interrupção
ou retardamento do processo patológico, ou prevenção de uma enfermidade ou de um
sintoma. idem
Segundo Linda Strand(1997), 6 o conceito de Atenção Farmacêutica estava incompleto,
passando então a defender a definição como prática na qual o profissional assume
a responsabilidade pela provisão das necessidades farmacoterápicas do paciente,
visando o compromisso de resolvê-las.
Na ótica da OMS a Atenção Farmacêutica é
[...] um conceito de prática profissional na qual o paciente é o
principal beneficiário das ações do farmacêutico. A atenção farmacêutica é o compêndio
das atitudes, os comportamentos, os compromissos, as inquietudes, os valores éticos,
as funções, os conhecimentos, as responsabilidades e as habilidades dos farmacêuticos
na prestação da farmacoterapia com o objetivo de obter resultados terapêuticos definidos
na saúde e na qualidade de vida do paciente. 6
A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) propõe que Atenção Farmacêutica
seja:
[...] um modelo de prática farmacêutica, desenvolvida no contexto
da Assistência Farmacêutica. Compreende atitudes, valores éticos, comportamentos,
habilidades, compromissos e co-responsabilidades na prevenção de doenças, promoção
e recuperação da saúde, de forma integrada à equipe de saúde. É a interação direta
do farmacêutico com o usuário, visando um farmacoterapia racional e a obtenção de
resultados definidos e mensuráveis, voltados para a melhoria da qualidade de vida. 3
Esse conceito proposto pela OPAS foi adotado em 2005 pela Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Na Espanha a atenção farmacêutica está
desenvolvendo intensamente. O Consenso de Granada definiu atenção farmacêutica como:
[...] a participação ativa do farmacêutico na assistência ao paciente
na dispensação e seguimento do tratamento farmacoterápico, cooperando com o médico
e outros profissionais de saúde, a fim de conseguir resultados que melhorem a qualidade
de vida dos pacientes. Também prevê a participação do farmacêutico em atividades
de promoção à saúde e prevenção de doenças. 3
Espejo acredita que essa atividade está inclusa no âmbito clínico,
e uma de suas principais atividades é a farmacoterapia, definida como:
[...] a prática profissional na qual o farmacêutico se responsabiliza
pelas necessidades do paciente relacionadas com os medicamentos mediante a detecção,
prevenção e resolução de problemas relacionados com os medicamentos (PRM), de forma
contínua, sistematizada e documentada, em colaboração com o próprio paciente e com
os demais profissionais do sistema de saúde, com o propósito de alcançar resultados
concretos que melhorem a qualidade de vida do paciente. 3
4.2. Conceitos de Promoção da Saúde
Os profissionais de saúde estão sendo cada vez mais cobrados para
que sua atuação vá além de prevenir e recuperar a saúde, que inclua sumariamente
a promoção da saúde no seu conceito mais completo. Para bem exercer as atividades
pertinentes à promoção da saúde, é necessário ter conhecimento a respeito de seus
conceito mais conhecidos:
Promoção da saúde é o conjunto de atividades, processos e recursos,
de ordem institucional, governamental ou da cidadania, orientados a propiciar o
melhoramento de condições de bem estar e acesso a bens e serviços sociais, que favoreçam
o desenvolvimento de conhecimentos, atitudes e comportamentos favoráveis ao cuidado
da saúde e o desenvolvimento de estratégias que permitam à população o maior controle
sobre sua saúde e suas condições de vida, a nível individual e coletivo. 7
Para outro autor, promoção da saúde inclui a resolução dos problemas
sociais a partir da integração de todos os grupos sociais:
A promoção da saúde como vem sendo entendida nos últimos 20-25 anos,
representa uma estratégia promissora para enfrentar os múltiplos problemas de saúde
que afetam as populações humanas e seus contornos nesse final de século. Partindo
de uma concepção ampla do processo saúde-doença e de seus determinantes, propõe
a articulação de saberes técnicos e populares, e a mobilização de recursos institucionais
e comunitários, públicos e privados, para seu enfrentamento e resolução. 7
A promoção da saúde, como uma das estratégias de produção de saúde,
ou seja, como um modo de pensar e de operar articulado às demais políticas e tecnologias
desenvolvidas no sistema de saúde brasileiro, contribui na construção de ações que
possibilitam responder às necessidades sociais em saúde. 8
4.3. Origem da Atenção Farmacêutica
No século XX, o papel do farmacêutico associava-se à produção e comercialização
de produtos medicinais, além disso, esse profissional apresentava grande vínculo
com equipes de saúde e com o próprio paciente. No entanto, essa atuação tradicional
sofreu uma diminuição, a partir da Segunda Guerra Mundial, em função do desenvolvimento
da indústria farmacêutica. 9
Esse fato levou a um descompasso entre a formação do profissional
e as ações demandadas pela sociedade, gerando uma frustração em alguns profissionais,
pois os conhecimentos adquiridos na graduação já não eram mais aplicados de forma
permanente na prática diária e acabavam se perdendo. 9
A partir de então, o farmacêutico relacionado à área assistencialista
distanciou-se das equipes de saúde e dos pacientes, passando a ser visto apenas
como um dispensador de produtos fabricados.
Nesse contexto surgiram, na década de 1960, líderes profissionais
e educadores norte-americanos que organizaram um movimento profissional com a finalidade
de questionar a formação e as atitudes do farmacêutico, bem como corrigir possíveis
erros cometidos no exercício de sua profissão. Além disso, discutia-se o conceito
de “orientação ao paciente” cuja conseqüência foi à criação do termo Farmácia Clínica,
a qual é “compreendida como uma atividade que permitiria novamente aos farmacêuticos
participar da equipe de saúde, contribuindo com seus conhecimentos para melhora
o cuidado com a saúde do paciente”. 9
Segundo o Comitê de Farmácia Clínica, da Associação dos Farmacêuticos
de Hospital dos EUA, a Farmácia Clínica é uma ciência da saúde cuja responsabilidade
é assegurar, mediante a aplicação de conhecimentos e funções relacionadas com o
cuidado dos pacientes, que o uso dos medicamentos seja seguro e apropriado, necessitando
de educação especializada e/ou treinamento estruturado. Requer, além disso, que
a coleta e interpretação de dados sejam criteriosas, que exista motivação pelo paciente
e que existam interações interprofissionais.
9
Esses conceitos, após serem difundidos mundialmente, despertaram
interesses no Brasil na década de 1980, especialmente na área hospitalar. Entretanto,
a atividade clínica exercida pelo farmacêutico não deve ser restrita a uma determinada
área, pois a exposição de agravos relacionados aos efeitos medicamentosos está presente
em qualquer ambiente que haja usuários de medicamentos. 9
A Farmácia Clínica, por sua vez, significou a introdução da orientação
prática farmacêutica ao paciente, mesmo apresentando ainda alguns conceitos que
enfatizavam o medicamento e não o paciente. A partir então surgiu, entre o final
da década de 1980 e o início de 1990, o conceito de Atenção Farmacêutica, a fim
de redirecionar o farmacêutico clínico à prestação de serviços para a assistência
individual. 9
Assim, a proposta da Atenção Farmacêutica é baseada no acompanhamento
farmacoterapêutico do paciente por meio de sua orientação, associado a prestação
de serviços farmacêuticos de qualidade, o que contribui para prevenir e detectar
resultados negativos da farmacoterapia para serem solucionados.
4.4. Atividades Pertinentes à Atenção Farmacêutica
Segundo o Código de Ética da Profissão Farmacêutica, “o farmacêutico
é um profissional da saúde, cumprindo-lhe executar todas as atividades inerentes
ao âmbito profissional farmacêutico de modo a contribuir para a salvaguarda da saúde
pública e, ainda, todas as ações de educação dirigidas à comunidade na promoção
da saúde”.10
Sendo o farmacêutico um profissional muito próximo das pessoas e
das comunidades, tem grandes possibilidades de interação e de influenciar em vários
âmbitos. 11Dessa forma é importante
que o farmacêutico desenvolva atividades que modifique positivamente o comportamento
da comunidade, já que nesta posição estratégica, ele é capaz de orientar o paciente
e atuar como agente sanitário de acesso fácil para a população e suas funções não
se limitam à dispensação, devendo abranger um ato profissional muito mais amplo,
em que deve expor todo seu conhecimento especializado, orientando também mudanças
em hábitos alimentares e estilo de vida. Mas isso só é possível se o profissional
estiver disposto e disponível para atuar veemente na construção da Atenção Farmacêutica,
principal atividade vinculada a estes cuidados.
Além desta, existem algumas atividades essenciais para considerá-la
implantada. Dentre as principais atividade que a caracterizam inclui-se a detecção
de suspeita de reações adversas e de intoxicações por medicamentos, orientação ao
paciente, comunicar ao prescritor e notificar o evento.
Segundo Vidotti e Silva 12, a implantação de ações de Atenção Farmacêutica
são muito importantes para aumentar a aderência ao tratamento, prevenir intoxicações,
promover o uso e armazenamento de forma segura, prevenir o surgimento de problemas
relacionados aos medicamentos (PRM), melhora na qualidade de comunicação com o paciente,
elaboração de educação em saúde e campanhas vinculadas às necessidades da comunidade.
Em um programa de Atenção Farmacêutica, o farmacêutico passa a conhecer
melhor o paciente. Sabe não apenas que medicamentos ele toma e de que maneira o
faz, mas também como se sente com o tratamento e com seu problema de saúde. Na prática,
o farmacêutico, de maneira organizada, coleta e avalia informações sobre o paciente,
incluindo a identificação possíveis Problemas Relacionados ao uso de Medicamentos
(PRM). Identificado o problema, busca a solução, formula e coloca em prática um
plano para corrigi-lo. Para executar este programa de atenção farmacêutica, o profissional
necessita ampliar suas habilidades e conhecimentos além daqueles utilizados na prática
tradicional. 12
Outras atividades também são muito úteis e poderiam ser desempenhadas
na farmácia comunitária, respeitando a legislação sanitária: aconselhamento ao paciente;
educação e promoção da saúde; aconselhamento em planejamento familiar e teste de
gravidez; participação em campanhas de sanitárias, apoio à interrupção do fumo,12 entre outras.
Através da Atenção Farmacêutica, o profissional pode levar o paciente
a realizar atividades de auto cuidado, a partir do aconselhamento sobre o fornecimento
de um medicamento ou outro tratamento que levam os pacientes à automedicação gerar
a consciência de que o paciente guarda para si o controle e a responsabilidade sobre
sua saúde. 12
Adicionalmente, o desenvolvimento de programas de Atenção Farmacêutica
deve ser feito com planejamento, implementação e avaliação dos resultados. Por isso,
o registro das atividades faz parte do processo da Atenção Farmacêutica,12 o que permitirá a análise do acompanhamento
farmacoterapêutico, se as atividades executadas melhoram o estado de saúde do paciente.
Segue uma figura que descreve sucintamente todas as atividades relacionadas
com a Atenção Farmacêutica. A figura deixa claro a necessidade de feedback, já que
desta forma é possível prever novas situações, realizar uma devida programação,
além de, é claro realizar a farmacovigilância. É válido lembrar que as atividades
a serem realizadas estão diretamente ligadas ao comportamento dos pacientes, e devem
estar sempre voltadas para o bem-estar destes.
4.5. Desafios para a Implantação da Atenção Farmacêutica
A Atenção Farmacêutica no Brasil encontra obstáculos para a sua implantação,
em função, por exemplo, do desinteresse tanto por parte dos proprietários de farmácias
comunitárias, quanto dos farmacêuticos em aderi-la.1
A prática dessa atividade profissional “exige ampla mobilização de
profissionais e acadêmicos.” Para isso, inicialmente houve a elaboração da Proposta
de Consenso Brasileiro de Atenção Farmacêutica e de novas diretrizes curriculares
dos cursos de farmácia, as quais:
“[...] enfocam a atuação como profissional da saúde, e exige do farmacêutico
a busca de um nível de aperfeiçoamento interdisciplinar condizente com as novas
responsabilidades, remetendo-o a assumir efetivamente a autonomia de seu cargo liberal,
incorporando os componentes da moral, ética e ideologia dentro de sua atuação.“ 1
A contribuição da Atenção Farmacêutica para a sociedade, tendo em
vista o uso racional de medicamentos e a melhoria da qualidade de vida do paciente
em conseqüência da promoção da saúde, ressalta a importância dessa atividade ser
implantada. Para isso, o desafio deve ser enfrentado a partir dos próprios farmacêuticos.
“Neste contexto, ocorre a necessidade do estímulo aos acadêmicos
e profissionais recém-formados, os quais possuem íntegra a energia e o anseio de
colaboração com a saúde da comunidade, de modo que ultrapasse as barreiras para
realização de programas de Atenção Farmacêutica, implantando-os além das perspectivas
de aceitação pela administração geral do estabelecimento farmacêutico e promovendo
admissão e entendimento da real necessidade do programa por parte da comunidade
atendida.” 1
4.6. A Atenção Farmacêutica na Promoção da Saúde
Em 1962, ocorreu uma epidemia de focomelia ocasionada pelo uso da
talidomida por gestantes, o que desencadeou uma reflexão sobre o uso dos medicamentos,
fazendo surgir ações de farmacovigilância. Com intuito de desenvolver maior atenção
à saúde do paciente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou na década de
1970 documentos que motivaram diversos países a promoverem uso racional de medicamentos.
Para isso, a atuação do farmacêutico na farmacoterapia fazia-se relevante.11
Nesse contexto, avaliou-se a possibilidade de intervenção desse profissional
na efetividade terapêutica a partir da Atenção Farmacêutica, por meio de:
• Acompanhamento e educação do e para o paciente;
• Avaliação dos seus fatores de risco;
• Prevenção da saúde;
• Promoção da saúde e vigilância das doenças;
• Disposição de serviços de prevenção clínica;
• Vigilância e publicações em saúde pública e
• Promoção do uso racional de medicamentos pela sociedade. 11
Os serviços fornecidos pela farmácia devem complementar o serviço
médico na atenção à saúde. O paciente com acesso a um tratamento prescrito que atendesse
à racionalidade terapêutica, juntamente com a avaliação de fatores que podem interferir
em seu tratamento, teria uma segurança maior na resolução de seus problemas. 11 A Atenção Farmacêutica visa proporcionar benefícios
como esse, o que reforça a importância de sua implantação.
A conduta do farmacêutico deve basear-se em responsabilidade, respeito,
consciência, entre outros, para a promoção da saúde. Afinal, ele “é o último profissional
de saúde que tem contato direto com o paciente depois da decisão médica pela terapia
farmacológica”. 11
O farmacêutico está voltando a cumprir o seu papel perante a sociedade,
corresponsabilizando-se pelo bem estar do paciente e trabalhando para que este não
tenha sua qualidade de vida comprometida por um problema evitável, decorrente de
uma terapia farmacológica. Este é um compromisso de extrema relevância, já que os
eventos adversos a medicamentos são considerados hoje uma patologia emergente e
são responsáveis por grandes perdas, sejam estas de ordem financeira ou de vida. 10
Além da humanização profissional, há também aspectos relacionados
ao ambiente do atendimento para se realizar a Atenção Farmacêutica. É necessário
que haja instalações adequadas o suficiente para causar bem-estar e confiança ao
paciente, fazendo com que o farmacêutico possa atendê-lo em sala reservada, de forma
a garantir a privacidade no atendimento. 11
E partindo do pressuposto que a promoção da saúde é o processo que
permite às pessoas aumentar o controle sobre, e melhorar, sua saúde, e que a farmácia
comunitária é o local de atenção primária mais acessível da comunidade, o farmacêutico
comunitário tem grande importância nesse processo, não somente no ato de dispensar
medicamentos, mas também como educador em saúde e promotor do auto cuidado que são
práticas incluídas na Atenção Farmacêutica. 3
5. Resultados e Discussão
A prática e a ideologia de Atenção Farmacêutica são recente no contexto
da promoção da saúde no Brasil. Sua implantação tem encontrado inúmeros obstáculos
como infra-estrutura, disponibilidade do farmacêutico, número de funcionários, falta
de conhecimento por parte da população e dos farmacêuticos com formação anterior
ao surgimento da Atenção Farmacêutica ou com formação deficiente neste âmbito.
No período de 21 de maio a 2 de junho, foram realizadas 13 entrevistas
com farmacêuticos que atuam em farmácias comunitárias no município de Belo Horizonte,
a fim de verificar a realidade da Atenção Farmacêutica, bem como avaliar a satisfação
do profissional em atuar nessa área.
Dentre os entrevistados, 92,30% gostam da área em que atuam já que
é possível terem contato direto com a população. Todos dizem que possuem liberdade
para atuarem plenamente como farmacêuticos, ainda que 69,23% precisem dividir seu
tempo com as atividades administrativas e gerenciais na farmácia comunitária. No
entanto, quanto ao aspecto financeiro, os entrevistados acreditam que a remuneração
é incompatível com as responsabilidades que eles assumem; houve queixas a respeito
dos profissionais que aceitam trabalhar com remuneração abaixo do estabelecido pelo
piso salarial, situação proibida pelo Código de Ética do Farmacêutico 10 e que inclusive contribui para a desvalorização
do profissional.
Quanto à formação dos farmacêuticos entrevistados, observou-se que
38,46% possuem cursos de pós-graduação, 7,69% estão cursando e 53,84% não possuem
cursos de pós-graduação e não possuem perspectivas de fazê-lo devido a questões
financeiras e relativas a tempo disponível.
Em relação às perspectivas de crescimento dentro da empresa, 20,07%
não possuem nenhuma perspectiva, 38,46% possuem possibilidade de subirem de cargo
de acordo com seu desempenho e tempo de experiência e 38,46% são proprietários ou
já atingiram o nível máximo de crescimento dentro da empresa.
Tendo em vista o atendimento aos clientes no balcão,verificou-se
que 76,93% dos farmacêuticos entrevistados não recebem comissão sobre vendas e por
isso não são rejeitados pelos balconistas; 23,07% recebem comissão sobre vendas
o que às vezes causa concorrência entre o farmacêutico e o balconista.
Durante as entrevistas, questionou-se a respeito da implantação da
Atenção Farmacêutica, 38,46% acreditam que já estão a colocando em prática, entretanto
observou-se que estes entrevistados desconhecem o que de fato é Atenção Farmacêutica,
e confundem com a simples orientação dada a qualquer paciente que peça alguma informação
ou esclarecimento de dúvidas no ato da dispensação. Observou-se também a existência
de farmacêuticos que vêem no atendimento diferenciado de grupos de pacientes, com
destaque para diabéticos e hipertensos, como sendo uma prática da Atenção Farmacêutica.
Já 61,54% dos entrevistados sabem que não colocam em prática a Atenção
Farmacêutica e justificam a ausência desta como sendo devido a impossibilidade de
permanência de um farmacêutico em período integral apenas para realizá-la, além
disso, seria necessário um ambiente organizado de forma específica para esse atendimento
com formulários para o arquivamento do histórico de saúde e uso de medicamentos
dos pacientes.
Na opinião desse último grupo de farmacêuticos, a Atenção Farmacêutica
é uma prática interessante que contribuiria para a promoção da saúde, visto que
o paciente seria melhor orientado, faria o uso racional dos medicamentos e a detecção
de Problemas Relacionados a Medicamentos (PRM), durante o tratamento, seria mais
eficiente.
6. CONCLUSÃO
A Atenção Farmacêutica apresenta conceito abrangente, o qual envolve
a prestação de uma assistência individualizada voltada para a avaliação da terapia
farmacológica, as reações adversas, uso racional de medicamentos, eficácia do tratamento
e outros Problemas Relacionados a Medicamentos (PRM).
Para efetivar a prática da Atenção Farmacêutica, é necessário a adesão
dos farmacêuticos, dos proprietários de farmácias comunitárias e da população que,
em geral, desconhece essa prática. Sendo assim, a implantação da Atenção Farmacêutica
exige investimentos nos aspectos financeiros e acadêmicos, além da motivação dos
farmacêuticos no seu exercício profissional.
De acordo com a pesquisa de campo realizada, constatou-se que a Atenção
Farmacêutica enfrenta desafios para sua implantação. A disponibilidade do farmacêutico,
o conhecimento sobre essa prática, a infra-estrutura adequada e o interesse de investimentos
dos empresários são elementos fundamentais para a implantação da Atenção Farmacêutica.
Observou-se a ausência desses elementos nas farmácias comunitárias visitadas, além
do que alguns farmacêuticos, apesar de acreditarem que praticam a Atenção Farmacêutica,
não conhecem realmente o que é essa prática profissional.
A implantação da Atenção Farmacêutica beneficiaria toda a população,
uma vez que ela reduziria os agravos relacionados a medicamentos. Dessa forma, o
envolvimento do farmacêutico com a Promoção da Saúde seria maior, sua atividade
estaria diretamente vinculada ao bem estar do paciente o que reforça a importância
de colocar a Atenção Farmacêutica, atividade que implementa os serviços farmacêuticos,
em prática.
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NASCIMENTO, YONE ALMEIDA; UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS -
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Disponível em:
Acesso em 09 de junho de 2008
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