NOÇÕES GERAIS SOBRE O USO RACIONAL DE MEDICAMENTOS (URM)
INTRODUÇÃO
Os medicamentos modernos ocupam um papel importante nos sistemas
sanitários, pois salvam vidas e melhoram a saúde. No entanto, existem milhões
de pessoas com doenças comuns, como pneumonia, malária, tuberculose,
hipertensão e outras tantas enfermidades, sujeitas a vicissitudes frequentemente
relacionadas aos tratamentos medicamentosos. Como exemplos, temos: falta de
acesso a um tratamento adequado ou a recursos para sua aquisição; uso de
medicamentos de baixa qualidade, resultando em processos falhos de seleção,
abastecimento e controle da qualidade; erros de medicação, tais como:
Ø Dose errada,
Ø Medicamento errado,
Ø Posologia errada,
Ø Duração errada etc.;
Ø Falta de orientação quanto ao tratamento –,
resultando em baixa adesão,
Ø Mau uso,
Ø Inefetividade.
A promoção do uso racional de medicamentos é um componente muito
importante de uma política nacional de medicamentos.
O medicamento é uma importante ferramenta terapêutica e muitas vezes
resultante do processo de prescrição, pode-se inferir a importância dos
medicamentos nesse processo (Brasil, 1998).
O uso racional ocorre quando o paciente recebe o medicamento apropriado
à sua necessidade clínica, na dose e posologia corretas, por um período de
tempo adequado e ao menor custo para si e para a comunidade (MSH, 1997). Dessa
forma, o uso racional de medicamentos inclui:
v Escolha terapêutica adequada (é necessário o
uso de terapêutica medicamentosa);
v Indicação apropriada, ou seja, a razão para
prescrever está baseada em evidências clínicas;
v Medicamento apropriado, considerando
eficácia, segurança, conveniência para o
paciente e custo;
v Dose, administração e duração do tratamento
apropriados;
v Paciente apropriado, isto é, inexistência de
contraindicação e mínima probabilidade
de reações adversas;
v Dispensação correta, incluindo informação
apropriada sobre os medicamentos prescritos;
v Adesão ao tratamento pelo paciente;
v Seguimento dos efeitos desejados e de
possíveis eventos adversos consequentes do tratamento.
Segundo Le Grand; Hogerzeil & Haaijer-Ruskamp (1999), o uso
irracional de medicamentos é um importante problema de saúde pública em todo o
mundo, com grandes consequências econômicas. Ainda segundo os mesmos autores,
tem sido estimado que a prescrição incorreta pode acarretar gastos de 50 a 70%
mais altos dos recursos governamentais destinados a medicamentos. Entretanto,
quando utilizados apropriadamente, os medicamentos são o recurso terapêutico
mais frequentemente custo-efetivos (McIsaac et al., 1994).
...
O URM envolve dois atores de forma fundamental: o prescritor e o
paciente (individual
ou coletivo). Estes atores interagem de forma dinâmica. O prescritor tem
papel determinante na conduta do paciente, mas o paciente também, com suas
expectativas, hábitos culturais etc. poderá influenciar os hábitos
prescritivos.
A relação destes atores está permeada por uma série de questões que
envolvem a capacidade de definição e implementação de uma política de
medicamentos, as relações do mercado farmacêutico, particularmente no que se
refere à propaganda médica, à organização da rede de serviços, em nível de
educação da sociedade, a fatores culturais de um modo geral e ao arcabouço
legal.
Um outro ator também de grande importância é o dispensador, pois muitas
interferências positivas ou negativas estão ligadas à forma como a dispensação
acontece .
Algumas áreas, dentro do conhecimento farmacêutico, têm-se desenvolvido
no sentido
de procurar estudar essas relações e seus determinantes, em que podemos
destacar as
seguintes: os Estudos de Utilização de Medicamentos (EUM), a
Farmacovigilância e a Farmacoenomia.
Os resultados desses estudos irão orientar diversas estratégias de
intervenção na busca do uso racional, que, neste texto, agrupamos em: estratégias
para a promoção do URM dirigidas ao prescritor, promoção do URM dirigida à
comunidade (menos frequente que a anterior) (Le Grand; Hogerzeil &
Haaijer-Ruskamp, 1999) e informação de medicamentos. Procuramos, na Figura 1,
representar o modelo teórico conceitual da inter-relação dos elementos do URM.
Os esforços mais organizados para a promoção do uso racional tiveram
início nos anos
70, com a introdução do conceito de medicamentos essenciais pela OMS,
que tinha como
intenção principal tanto a promoção do uso racional como a garantia do
acesso. Apesar de atualmente cerca de 160 países contarem com listas de
medicamentos essenciais, ainda é bastante grande a parcela da população mundial
à margem de acesso universal aos medicamentos. Uma questão inicial na discussão
do estabelecimento dos diferentes tipos de intervenções para promoção ou
avaliação do uso racional consiste na identificação dos possíveis problemas,
para o que apresentam-se a seguir algumas possibilidades de classificação.
PRINCIPAIS PROBLEMAS QUANTO AO
USO DE MEDICAMENTOS
• SOBRE USO DE MEDICAMENTOS –
São particularmente os injetáveis, como consequência tanto da prescrição
excessiva quando do consumo exacerbado
• POLIMEDICAÇÃO OU POLIFARMÁCIA
– A OMS considera que, no nível da atenção básica de saúde (ABS), 1 ou 2
medicamentos por receita costumam ser suficientes
• USO INCORRETO DE MEDICAMENTOS
– Esta ‘categoria’ inclui o uso de um medicamento errado para uma condição
específica (antibióticos ou antidiarréicos para a diarréia infantil), o uso de
medicamentos de eficácia duvidosa (agentes anti-motilidade para diarréia),
emprego de fármacos de segurança questionável (dipirona) e uso de dose
inapropriada (caso frequente de antibióticos e TRO) Fonte: MSH (1997).
TIPOS DE PROBLEMAS NA PRESCRIÇÃO
PROBLEMAS DE PRESCRIÇÃO
EXEMPLO
PRESCRIÇÃO EXTRAVAGANTE
Ø Um medicamento barato proporcionaria
eficácia e segurança comparáveis a outro mais caro
Ø O tratamento sintomático de condições leves
desvia recursos de tratamento de enfermidades mais severas
Ø Utiliza-se um medicamento de determinada
marca quando existirem genéricos mais baratos
SOBREPRESCRIÇÃO
Ø O medicamento não é necessário
Ø A dose é exagerada
Ø O período de tratamento é demasiadamente
longo
Ø A quantidade dispensada é exagerada em
relação ao que será realmente utilizado
PRESCRIÇÃO INCORRETA
Ø O medicamento está receitado para um
diagnóstico incorreto
Ø Seleciona-se um medicamento equivocado para
determinada doença
Ø A prescrição está redigida de forma
inapropriada
Ø Não se fazem ajustes para fatores
coexistentes (clínicos, genéticos, ambientais e outros)
PRESCRIÇÃO MÚLTIPLA
Ø Utilizam-se dois ou mais medicamentos quando
um dos dois alcançaria virtualmente o mesmo efeito
Ø Procura-se atacar várias condições
relacionadas quando o tratamento da condição primária melhoraria ou resolveria
as demais
SUBPRESCRIÇÃO
Ø Não são prescritos os medicamentos
necessários
Ø A dose é insuficiente
Ø A duração do tratamento é demasiadamente
curta
Fonte: MSH (1997).
O USO INAPROPRIADO DE
MEDICAMENTOS PODE TER CONSEQUÊNCIAS COMO:
Eventos adversos, incluindo os letais. Exemplo: uso indevido de
antibióticos, autoprescrição ou uso inapropriado de automedicação;
v Eficácia limitada. Exemplo: quando não se
obtém o efeito esperado devido ao uso de dose subterapêutica;
v Resistência a antibióticos. Exemplo: o
sobreuso ou o uso em doses subterapêuticas;
v Farmacodependência. Exemplo: abuso de certos
medicamentos, tais como os tranqüilizantes;
v Risco de infecção. Exemplo: uso inapropriado
de injetáveis.
Todos os componentes do ciclo da Assistência Farmacêutica podem e devem
contribuir para a promoção do uso racional de medicamentos, o que tentaremos
rapidamente exemplificar:
SELEÇÃO E FORMULÁRIO
TERAPÊUTICO’:
Orienta as escolhas terapêuticas para medicamentos
eficazes, seguros e custos-efetivos, bem como orienta quanto às
abordagens terapêuticas
mais adequadas, inclusive, destacando as situações onde a abordagem não
medicamentosa pode ser mais apropriada. No Brasil, foi elaborado o Formulário
Terapêutico Nacional, baseado nos medicamentos contidos na Relação Nacional de
Medicamentos Essenciais (Rename) e disponível na Biblioteca Virtual em Saúde.
GERENCIAMENTO DA ASSISTÊNCIA
FARMACÊUTICA’:
O bom gerenciamento da Assistência Farmacêutica deve ter como resultado
a disponibilidade de medicamentos de qualidade, adquiridos com agilidade
satisfatória, baixo preço, armazenados e distribuídos de forma a preservar suas
características.
DISPENSAÇÃO E USO’:
Garante o acesso a medicamentos adequadamente envasados e rotulados, o
bom entendimento do uso do medicamento pelo paciente, bem como intervém junto
ao prescritor ou demais membros da equipe de saúde para assegurar a correta
prescrição.
Dessa forma, toda a abordagem contemplada anteriormente nesta obra trata
de estratégias para o uso racional de medicamentos, pois este é o fundamento
básico da
Assistência Farmacêutica.
Algumas áreas de estudo têm-se consolidado por acarretarem a mobilização
de técnicas e conhecimento específicos. Bem utilizadas, podem tornar-se
ferramentas importantes para o diagnóstico da realidade, fornecendo subsídios
técnicos e gerenciais para a tomada de decisão.
No texto a seguir, trataremos das abordagens mais específicas já
mencionadas, compreendidas no campo da farmacoepidemiologia, entre as quais se
incluem os estudos de utilização de medicamentos, a farmacovigilância e a
farmacoeconomia.
A despeito de todas estas intervenções implicarem em um maior rigor
técnico científico e necessitarem, para sua aplicação mais acurada, da
participação de pessoal especializado, vários aspectos podem ser implementados
sem grandes complicações, permitindo ao gestor local a obtenção de resultados
expressivos.
Em um segundo momento, serão abordadas intervenções de promoção do uso
racional dirigidas à população em geral, intervenções dirigidas ao prescritor e
informação de medicamentos.
REFERÊNCIAS
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FONTE : MINISTÉRIO DA
SAÚDE. FORMULÁRIO TERAPÊEUTICO NACIONAL
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