ERROS
DE MEDICAÇÃO EM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO: TIPO, CAUSAS, SUGESTÕES E PROVIDÊNCIAS
Errors of medication
in a University Hospital: type, causes, suggestions and actions
Errores de medicación en hospital universitario: tipos, causas,
sugerencias y providencias
Ana Elisa Bauer de Camargo SilvaI; Silvia Helena
De Bortoli CassianiII
IEnfermeira.
Professora Assistente da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Goiás.
Doutoranda do Programa Interunidades da Escola de Enfermagem/ Escola de Enfermagem
de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo
IIEnfermeira. Professora Titular do Departamento de Enfermagem
Geral e Especializada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - Universidade de
São Paulo E-mail do autor:
anaelisa@terra.com.br
RESUMO
Este
estudo survey exploratório analisou os erros de medicação de um hospital universitário
a partir de 40 entrevistas realizadas com profissionais do sistema de medicação.
Os resultados mostraram que os tipos de erros mais frequentes estão na prescrição
de medicamentos (29,04%); as falhas individuais são consideradas as principais causa
da ocorrência de erros (47,37%) e as principais falhas do sistema de medicação (26,98%);
as alterações nas atitudes individuais são sugestões para evitar erros (28,26%);
as orientações são as providências administrativas mais utilizadas (25%). Concluiu-se
que não há consciência sistêmica entre os profissionais a respeito dos erros, focando
a culpa no ser humano. É necessário que esta cultura seja alterada e transformada
em melhorias para o sistema.
Descritores: erros de medicação; sistemas de medicação
no hospital; administração hospitalar
ABSTRACT
This exploratory
study (survey) has analyzed the errors of medication in a university hospital on
the basis of 40 interviews conducted with professionals of the medication system.
The results showed that the most frequent types of errors occur in drug prescription
(29.04%); individual flaws are considered the main cause of errors (47.37%) and
the main flaws in the medication system (26.98%); changes in individual attitudes
are suggested as a way to avoid errors (28.26%); guidance is the most utilized administrative
action (25%). The conclusion is that there is no systemic awareness among professionals
regarding errors, putting the blame on the human being. This culture must be altered
and transformed into improvements for the system.
Descriptors: errors of medication;
hospital medication systems; hospital administration
RESUMEN
Este
estudio survey exploratorio analizó los errores en la medicación de un hospital
universitario a partir de 40 entrevistas realizadas a profesionales del sistema
de medicación. Los resultados mostraron que los tipos de errores mÁs frecuentes
están en la prescripción de medicamentos (29.04%); las fallas individuales se consideran
la principal causa de que ocurran errores (47.37%) y las principales fallas del
sistema de medicación (26.98%); las alteraciones en las actitudes individuales son
sugerencias para evitar errores (28.26%); las orientaciones son las precauciones
administrativas más utilizadas (25%). Se concluyó que no hay conciencia sistemática
entre los profesionales al respecto de los errores, enfocando la culpa en el ser
humano. Es necesario que se cambie esta cultura y se transforme en mejoras al sistema.
Descriptores: Errores de medicación; sistemas de medicación
en hospital; administración hospitalaria
1 INTRODUÇÃO
Os
medicamentos, há séculos, vêm sendo utilizados com a intenção de aliviar, combater
a dor ou curar doenças; no entanto, estudos, ao longo dos últimos anos, têm evidenciado
a presença de erros no tratamento medicamentoso recebido pelos pacientes. Muitos
desses erros podem não trazer consequências ou complicações sérias aos pacientes,
mas outros podem contribuir para aumentar sua estadia hospitalar, deixar sequelas
ou até mesmo levá-los à morte(1-3).
Os
erros de medicação são considerados eventos adversos ao medicamento passíveis de
prevenção, com possibilidade de ocorrer em um ou em vários momentos dentro do processo
de medicação, desde a prescrição até a administração de medicamentos(4).
O National Coordinating Council For Medication
Error Reporting And Prevention (NCC MERP), uma corporação norte - americana
fundada para disseminar conhecimento, estimular relatos e prevenir erros, define
erro de medicação como:
Qualquer
evento evitável que pode causar ou induzir ao uso inapropriado de medicamento ou
prejudicar o paciente enquanto o medicamento está sob o controle do profissional
de saúde, paciente ou consumidor. Tais eventos podem estar relacionados à prática
profissional, produtos de cuidado de saúde, procedimentos, e sistemas, incluindo
prescrição; comunicação; etiquetação, embalagem e nomenclatura; aviamento; dispensação;
distribuição; administração; educação; monitoramento e uso(5).
Este
tipo de erro vem representando uma triste realidade para os pacientes, profissionais
e instituições hospitalares, pois suas conseqüências repercutem nos indicadores
de qualidade da assistência à saúde(6).
A
preocupação com as ocorrências do erro de medicação intensificou-se a partir da
publicação do relatório doInstitute of Medicine (EUA), intitulado To error is human: building a safer health
system, em novembro de 1999, que tem sido referência para muitos estudos. Esse
relatório apontou que das 33,6 milhões de internações realizadas no ano de 1997,
em hospitais dos EUA, por volta de 44.000 a 98.000 americanos morreram devido a
problemas causados por erros médicos, o que excede as mortes por veículos motorizados,
câncer no seio e AIDS(7). Os dados apontam uma média de 6,5 eventos adversos
ao medicamento por 100 internações, dos quais 28% destes eventos poderiam ter sido
prevenidos(8).
Os
erros de medicação trazem também sérias conseqüências econômicas às instituições
de saúde. Estima-se um gasto de aproximadamente US$ 4.700 por evento adverso de
medicamento evitável ou por volta de US$ 2,8 milhões, anualmente, em um hospital
de ensino com 700 leitos(7, 9, 10).
Considerando
que cerca de 30% dos danos durante a hospitalização, estão associados a um erro
de medicação, torna-se imprescindível a busca contínua por ações que minimizem este
risco(11) .
Estudos
sobre a incidência de erros de medicação e a busca por maior segurança no processo
de distribuição e administração dos mesmos, nos EUA, tiveram início na década de
50(12). Entretanto, no Brasil, somente na década de 90 é que proliferaram
estudos sobre o tema.
Os
tipos de erros descritos tanto na literatura nacional como na internacional são:
erros de omissão; erros por dose extra; erros de via; erros de dosagem; erros devido
ao horário incorreto; erros com medicamentos deteriorados; erros de prescrição;
erros de distribuição; erros devido à incorreção na preparação do medicamento; erros
devido a técnicas incorretas na administração; erros na administração de um medicamento
não autorizado(1, 12,13).
Em
estudo realizado, em dois hospitais terciários, o erro de dosagem foi o tipo de
erro mais comum (28%) no processo de prescrição(14).Outro estudo identificou
que os erros ocorreram mais freqüentemente nos processos de prescrição (56%) e administração
de medicamentos (34%)(8).
São
várias as causas que podem levar a erros de medicação. Estas podem estar relacionadas
a fatores individuais como: falta de atenção, lapsos de memória, deficiências da
formação acadêmica, inexperiência, negligência, desatualização quanto aos avanços
tecnológicos e científicos(5,15).
No
entanto, problemas no sistema de medicação, também podem ser considerados como causa
de um erro, quais sejam: iluminação inadequada, nível alto de barulho, interrupções
freqüentes, falta de treinamento e de profissionais, políticas e procedimentos ineficientes
ou mesmo problemas com os produtos utilizados na medicação do paciente(5,15).
Portanto,
o indivíduo raramente é a única causa, devendo-se considerar as falhas detectadas
como falhas do sistema(16).O sistema de medicação deve ser estruturado
para promover condições que auxiliem na minimização e prevenção dos erros, implementando
estratégias que auxiliem os profissionais a não errar. Uma estratégia utilizada
para prevenção dos erros de medicação é a mudança na cultura da instituição, eliminando
a punição e estimulando o relato dos erros para transformá-los em aprendizado para
todos e em práticas de melhoria para o sistema(17,18).
A
partir destas considerações este estudo teve como objetivo identificar e analisar
os erros de medicação a partir da opinião de uma amostra de profissionais envolvidos
no sistema.
2 METODOLOGIA
Desenvolvemos
um estudo do tipo survey exploratório em um hospital geral universitário,
escolhido por ser campo de estágio para vários centros formadores de profissionais
de saúde e por participar da rede nacional de hospitais sentinela da Agência Nacional
de Vigilância (ANVISA) para notificação de queixas técnicas e efeitos adversos relacionados
à produtos de saúde.
Para
obtenção dos dados, escolhemos dois setores dentro do hospital, quais sejam: a unidade
de clínica médica e a farmácia hospitalar.
Selecionamos
a primeira por possuir, em média, 70 leitos reservados a pacientes portadores de
doenças crônico-degenerativas que, usualmente, fazem uso de grande e variada gama
de medicamentos em seu tratamento. E a farmácia hospitalar, por ser a responsável
pela aquisição, estocagem, conservação, controle, dispensação e distribuição dos
medicamentos para todo o hospital.
Para
obtenção dos dados realizamos entrevistas semi-estruturadas com os profissionais
que desempenhavam funções ligadas à medicação na unidade de clínica médica e na
farmácia hospitalar .
O
objetivo foi obter opiniões sobre os tipos de erros mais freqüentes, as causas da
ocorrência desses erros, as providências tomadas, as falhas do sistema e obter sugestões
para prevenção dos erros de medicação.
O
projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Médica e Humana
e Animal do hospital. E dos sujeitos obteve-se o consentimento livre e informado.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Realizamos
as entrevistas com intuito de conhecer como os médicos, as equipes de enfermagem
e de farmácia percebem o sistema de medicação e os erros de medicação.
Obtivemos
um total de 40 entrevistas com profissionais dos três turnos de trabalho, sendo:
12 médicos residentes; 4 enfermeiras supervisoras, 14 técnicos de enfermagem e 2
auxiliares de enfermagem, somando 20 profissionais de enfermagem. Entrevistamos,
também, 3 farmacêuticos e 5 técnicos de farmácia, totalizando 8 profissionais da
equipe de farmácia.
Os
médicos entrevistados corresponderam a 75% da população de residentes da clínica
médica; os profissionais de enfermagem corresponderam a 33,33% da equipe de enfermagem
e os profissionais da farmácia corresponderam a 42, 10% da equipe de farmácia.
Os
tipos de erros relacionados à medicação, citados pelos participantes, foram os relacionados
à prescrição de medicamentos com 29% dos resultados, seguidos dos erros relacionados
ao horário com 20,6% e ao preparo e administração dos medicamentos com 13,6%.
Em
relação aos erros de prescrição de medicamentos, identificamos que a maioria das
respostas partiu da equipe de enfermagem, sendo 23 entre as 45 respostas obtidas,
provavelmente porque este profissional é o que mais depende de uma prescrição completa,
correta e legível, para exercer suas atividades. Decidimos analisar a categoria
erros relacionados à prescrição sob dois aspectos: erros ou inadequação da prescrição
e dificuldade para compreensão de letra.
Em
relação aos erros ou inadequação da prescrição, 34 (21,9%) respostas referiam-se
a problemas como dosagem, via, posologia, diluição, prescrição de medicamento inadequado,
fatores preocupantes, pois dessas prescrições dependem os processos seguintes e
o tratamento adequado do paciente.
A
administração de medicamentos errada (36%) e em doses erradas (35,3%) têm sido os
tipos de erros mais frequentes cometidos na medicação, e estes podem ter sido cometidos
já na prescrição de medicamentos(20).
As
inadequações nas prescrições estão justificadas em 11 das 34 respostas, tendo como
causas as prescrições feitas por acadêmicos de medicina, pessoas não-aptas a exercer
essa atividade que, na maioria das vezes, copiam a prescrição anterior, cometendo
erros que poderão ser perpetuados. Apresentamos a seguir relatos abordando o problema:
Aconteceu de ficarem 03 dias prescrevendo cabeceira elevada
SC. Nem presta atenção no que está fazendo, nem lê. É uma cópia, e às vezes até
uma cópia errada, porque sei lá uma insulina SC, cabeceira elevada, emenda as duas
faz uma só e nem pensa no que está escrevendo
(E).
O estagiário de medicina (interno) havia prescrito uma medicação
[...] na papeleta estava escrito: Aerosol: SF 0,9% e BITOC. Há alguns dias técnicos
circulavam o horário porque não sabiam o que era BITOC....uma funcionária ficou
com dúvida e procurou o interno que havia prescrito [...] perguntou que medicamento
era aquele e para que servia, o interno disse que era BITOC e não sabia para que
servia. Então eles procuraram em prescrições anteriores (05 dias antes desse dia)
e acharam que era BEROTEC e não BITOC (TE).
Em
estudo realizado em dois hospitais terciários, Brigham and Women's Hospital e Massachusets
General Hospital, durante seis meses no ano de 1993, mostraram que erros de
dosagem foram os mais comuns (28%), ocorrendo a maioria deles (50 de 95) no processo
de prescrição(14).
Os
médicos prescritores devem atualizar seus conhecimentos através de literaturas,
consultas aos farmacêuticos, consultas a outros médicos, como também devem participar
de programas de educação continuada para determinar uma terapia medicamentosa adequada
aos seus pacientes, principalmente em casos de doenças ou em condições pouco comuns
à sua prática(21).
Em
relação aos problemas de compreensão de letra, obtivemos20% do total de 45 erros
na prescrição, que pode estar relacionado à má grafia médica na prescrição manual.
A
seguir, estão algumas citações que esclarecem as dificuldades encontradas pelos
profissionais durante a leitura das prescrições: Letra ruim demais. Médico escreve [...] tem
que ser artista pra saber (TE). Assim, primeiro eles acham que a gente é
adivinho, porque as letras são uns garranchos e os medicamentos, principalmente
antibióticos, tem uns nomes muito idênticos, cefalosolina cefalotina, você confunde
mesmo. Aí é hora de ir medicação errada (TF).
As
prescrições de medicamentos são o início de uma cadeia de ações que levarão o medicamento
até o paciente, não podendo constituir um fator exarcebado para erro ou potencial
para erro de medicação. A prescrição de medicamentos em sistema computadorizado,
certamente, ocasionará um grande impacto na redução de erros nos medicamentos. Mudar
os sistemas pelos quais os medicamentos são prescritos é uma significativa estratégia,
capaz de reduzir o número de injúrias relacionadas aos mesmos(11,22).
Em
relação à categoria erros relacionados
ao horário, estes corresponderam a
20,6% das respostas. Dentre 32 respostas, 17 (53,1%) referiam-se a atrasos na dispensação
e na demora da entrega do medicamento na unidade de internação pela farmácia.
A
seguir alguns depoimentos sobre o assunto: Ocorre
geralmente de algumas prescrições estarem assim: fazer Lasix às 10 e às 16 horas,
mas às 10h a medicação ainda não chegou. Então as das 10 fica sem fazer, e vai para
o dia seguinte (E). Atraso do medicamento porque a farmácia traz
só às 15 horas. Para não sair da rotina, atrasa o medicamento (TE).
Os
erros relacionados ao preparo e administração de medicamentos apareceram em 13,6%
dos relatos, dentre os quase destacamos: Cheguei
de manhã, estava o soro glicosado com o rótulo escrito nele à mão: soro fisiológico.
Então foi preparado errado(M). De
medicação trocada. Ontem mesmo aconteceu com um enfermeiro que deu uma medicação
intradérmica sendo que era subcutânea. A paciente disse que estava com dor, que
estava doendo (TE).
Há
três estratégias para minimizar erros no preparo e na administração da medicação:
cumprimento de políticas e procedimentos referentes ao preparo e à administração;
educação dos profissionais e melhora na comunicação(6).
Em
relação aos procedimentos, deve-se seguir os cinco "certos": paciente
certo, horário de administração certo, dose certa, via de administração certa, e
medicamento certo; ler o rótulo do medicamento três vezes; esclarecer dúvidas antes
de prepará-los; identificar o medicamento preparado com o nome do paciente, enfermaria/
leito, nome do medicamento e via de administração; certificar-se da suspensão de
medicamentos na prescrição médica e sobre possíveis preparos para exames ou jejum,
uso da pulseira de identificação do paciente, assim como a identificação do leito(6).
Erros
relacionados à dispensação foram citados por 12,9% dos entrevistados e se referiram
à falta e troca de medicamentos. Seguem alguns exemplos: Tem muitos erros assim, às vezes troca medicamento,
como esses dias mesmo [...] estava prescrito Sulcafrate e foi mandado Sustrate [...]
Às vezes o medicamento vem errado, vem faltando dose. Às vezes está prescrito E
V, vem VO (TE). [...] Esses dias veio Cipro no lugar
de Maxcef. Quando o medicamento é de 12/12, é pra subir 02 comprimidos, só mandaram
01(AE).
Os
erros mais comuns na dispensação de medicamentos envolvem doses ou formas incorretas,
que podem ocorrer devido a distrações ou problemas com o ambiente de trabalho(15),
problemas que foram também encontrados no hospital em estudo.
As
respostas sobre as causas dos erros relacionadas à medicação, apontaram a falta
de atenção como a principal causa para erro de medicação, sendo citada em 27,6%
dos relatos, seguida das falhas individuais, com 19,7%. Estas somadas representaram
47,4% das causas de erros.
Estudo
referente a erros de medicação identificou que a falta de atenção e lapsos de memória
foram os responsáveis pelas causas de erros de medicação sendo 11% na prescrição
e 12% na administração de medicamentos(14). Muitos estudos têm responsabilizado
os médicos prescritores pela maioria dos erros de medicação, e dois deles indicaram
que os enganos ou lapsos foram as causas mais freqüentes de erros (57%)(20,23).
O
que chama a atenção é o fato de os profissionais culparem a si mesmos pelos erros,
deixando de lado a visão de que o sistema em que estão envolvidos pode também colaborar
para sua ocorrência.
Excesso
de trabalho e falta de tempo foram a terceira causa dos erros ocorridos, com 14,5%
das respostas, e estes, possivelmente, podem ser motivos que concorreram para falhas
individuais e falta de atenção, tantas vezes citados pelos profissionais.
Estudo
desenvolvido na Inglaterra, por farmacêuticos, identificou como causas de erros
na prescrição fatores de risco, como: ambiente de trabalho, carga de trabalho, prescrição
realizada ou não para o seu paciente, comunicação entre os membros da equipe, bem-estar
físico e mental e ausência de conhecimento(23).
Os
erros de medicação podem ser causados por falta de conhecimento, más condições ambientais,
materiais inadequados oferecidos ao profissional, ou por problemas pessoais que
podem levá-lo à distração. Abordagens pessoais consideram que atos inseguros, como
falta de atenção, negligência ou desvio de conduta sejam algumas das causas de erros(24).
Vale
salientar que os problemas administrativos e os detectados na organização da unidade
em estudo surgem como a quarta causa de erros de medicação. Os fatores organizacionais
que podem ser identificados como causas para os erros de medicação são: treinamento
inadequado, a baixa percepção da importância da prescrição, a hierarquia na equipe
médica e a ausência de autoconsciência dos erros(23).
Quanto
às providências administrativas tomadas nos casos de erros de medicação, conhecidas
pelos profissionais, identificamos que em 50% dos relatos, os entrevistados mencionaram
que a orientação e a advertência verbal ou escrita foram as medidas administrativas
mais utilizadas na ocorrência de erro de medicação, seguidas de suspensão ou demissão,
com 16,1% das respostas.
Constatamos
que a maioria delas referia-se a medidas direcionadas aos indivíduos que erraram
e não para o sistema e para o desenvolvimento de estratégias que visassem aproveitar
esse erro e transformá-lo em aprendizado.
Na
ocorrência de um erro de medicação, não é dada ênfase à educação e sim à punição.
Este fato, ao invés de ajudar a prevenir, faz com que cada vez menos os erros sejam
relatados, prejudicando o conhecimento de seus fatores de risco, permitindo sua
repetição uma vez que são subnotificados(25).
No
que concerne às sugestões dos
profissionais para prevenção dos erros de medicação identificamos que 62,0% das sugestões foram
direcionadas aos profissionais, tendo alterações nas atitudes individuais recebido
28,3% das respostas, seguidas da educação continuada com 15,2% e aumento da supervisão,
vigilância e punição com 10,9%.
Percebemos
que mais uma vez o indivíduo foi responsabilizado pelo sucesso ou insucesso da terapia
medicamentosa.
As
sugestões voltadas para o sistema de medicação corresponderam a 38% das respostas,
sendo a maior parte delas citadas pelos profissionais da farmácia, tais como: informatização
do sistema obteve 7,6% das respostas; reestruturação da farmácia também 7,6%; melhorar
comunicação e interação entre setores e pessoas 5,4%; alterações no processo de
prescrição de medicamentos e avaliação no processo de dispensação também 5,4%.
Em
um sistema que funciona nos moldes punitivos, é muito difícil que os profissionais
tenham coragem de relatar seus erros, e mesmo que o fizessem não haveria ganhos
para a instituição, pois eles não seriam utilizados para mudanças nos processos
ou para implementação de estratégias voltadas a melhorias(26).
As
opiniões obtidas sobre as falhas
no sistema de medicação que estão contribuindo
para a ocorrência de erros, mostraram que as questões direcionadas aos indivíduos
foram as mais citadas, recebendo opiniões de 27% dos entrevistados, associadas a
problemas existentes nas etapas de prescrição (15,9%) e dispensação de medicamentos
(14,3%).
Através
destes dados percebemos que os profissionais não possuem uma visão sistêmica do
problema, mas sim individualizada, cabendo a cada profissional promover a segurança
do paciente, uma vez que as falhas individuais apareceram como falhas do sistema,
em 27% dos depoimentos.
Este
resultado mostrou-se coerente se considerarmos que, nas respostas anteriores, as
questões que envolvem o indivíduo também foram mencionadas com destaque.
As
instituições devem prover um sistema seguro de medicação que objetive construir
estratégias que irão auxiliar os profissionais na prevenção de erros, através de
medidas que tragam facilidades para ação de medicar e dificuldades para as oportunidades
de errar.
Para
que práticas de segurança sejam discutidas e implementadas pela organização é necessário
que seus dirigentes assumam e desenvolvam uma cultura de segurança voltada para
o paciente e organizem uma equipe multidisciplinar que lidere essas discussões,
buscando analisar e avaliar cada processo existente, em busca de melhorias.
4 CONCLUSÕES
Segundo
a opinião dos profissionais os erros de medicação nesta instituição ocorrem com
mais frequência no processo de prescrição de medicamentos, com problemas referentes
à sua legibilidade e à inadequação dos medicamentos prescritos.
As
falhas humanas como falta de atenção, falta de conhecimento, falta de interesse
e a pressa são consideradas a razão dos erros de medicação.
Parece
não haver entre os profissionais a consciência de que o sistema de medicação pode
auxiliar na prevenção ou na ocorrência dos erros, dependendo de como este está estruturado.
Os profissionais concentram a visão dos erros nos indivíduos, podendo este fato
refletir a cultura transmitida por seus chefes e pela própria instituição.
A
instituição ao adotar medidas administrativas voltadas apenas para seus profissionais
pode estar provocando uma subnotificação dos erros e não conseguindo visualizar
os problemas existentes, consequentemente diminuindo suas chances de desenvolver
um trabalho de prevenção de erros.
Medidas
como treinamento da sobre erros de medicação, adoção de relatórios de ocorrência
de erros sem consequentes punições aos envolvidos, implementação de medidas administrativas
voltadas ao planejamento do sistema de medicação e não aos indivíduos, podem ser
estratégias iniciais em busca de maior segurança para o paciente.
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