DOENÇA DE CHAGAS
Aspectos Epidemiológicos
A Doença de Chagas
era, primitivamente, uma enzootia que afetava exclusivamente animais
silvestres, transmitida por triatomíneos também silvestres. O homem, ao invadir
estes ecótopos naturais, possibilitou que os triatomíneos se instalassem em
seus domicílios, transformando a tripanosossomíase
americana em uma antropozoonose. É uma parasitose exclusiva do continente
americano. No Brasil, o risco da transmissão correspondia a 36% do território
do país, atingindo mais de 2.450 municípios, que se estendiam do Maranhão ao
Rio Grande do Sul, incluindo grande parte das regiões Nordeste, Sudeste, Sul e
Centro-Oeste. O inquérito sorológico nacional, realizado no final da década de
70, estimou a existência de 5 milhões de brasileiros infectados pelo Trypanosoma
cruzi. Grande parte dessas infecções se deram na área rural, em virtude
do contato dos indivíduos com fezes de triatomíneos domiciliados. Até
recentemente, esta era a principal forma de transmissão da infecção.As medidas
de controle adotadas, centradas no combate dos vetores domiciliados com
inseticidas, proporcionou a virtual eliminação da principal espécie vetora no
país, o Triatoma infestans, em parte desta área modificando consideravelmente a
epidemiologia da doença, no que diz respeito à sua incidência e formas de
transmissão. Casos autóctones, que até recentemente vinham sendo detectados de
maneira isolada na Amazônia, vêm aumentando gradativamente nos últimos anos, ao
mesmo tempo que espécies de triatomíneos silvestres aproximam-se perigosamente
do domicílio humano, o que significa que a endemia pode se expandir
geograficamente
Ø Agente Etiológico: é o Trypanosoma cruzi, protozoário
flagelado da ordem Kinetoplastida, família Trypanosomatidae, caracterizado pela
presença de um flagelo e uma única mitocôndria. No sangue dos vertebrados, o
Trypanosoma cruzi se apresenta sob a forma de trypomastigota e, nos tecidos,
como amastigotas. Nos invertebrados (insetos vetores), ocorre um ciclo com a
transformação
Ø dos tripomastigotas
sangüíneos em epimastigotas que depois se diferenciam em trypomastigotas
metacíclicos, que são as formas infectantes acumuladas nas fezes do inseto. ·
Reservatórios Além do homem, mamíferos domésticos e silvestres têm sido
naturalmente encontrados infectados pelo Trypanosoma cruzi, tais como: gato,
cão, porco doméstico, rato de esgoto, rato doméstico, macaco de cheiro, sagüi,
tatu, gambá, cuíca, morcego, dentre outros. Os mais importantes epidemiologicamente
são aqueles que coabitam ou estão muito próximos do homem como o cão, o rato, o
gambá, o tatu, e até mesmo o porco doméstico, encontrado associado com espécies
silvestres na Amazônia. As aves e animais de "sangue frio" (lagartos,
sapos, outros) são refratários à infecção.
Ø Modo de Transmissão: a transmissão natural ou primária da
Doença de Chagas é a vetorial, que se dá através das fezes dos triatomíneos,
também conhecidos como "barbeiros" ou chupões". Esses, ao picar
os vertebrados, em geral defecam após o repasto eliminando formas infectantes
de trypomastigotas metacíclicos presentes em suas fezes e que penetram pelo
orifício da picada ou por solução de continuidade deixada pelo ato de coçar.
Com a diminuição da densidade triatomínica domiciliar ou mesmo com a eliminação
daquela espécie estritamente domiciliar (Triatoma infestans), reduziu-se
significativamente a transmissão vetorial que, na década de 70, se estimava ser
responsável por 80% das infecções humanas. A transmissão transfusional ganhou
grande importância epidemiológica nas duas últimas décadas em função da
migração de indivíduos infectados para os centros urbanos e da ineficiência no
controle das transfusões nos bancos de sangue. A transmissão congênita ocorre,
mas muitos dos conceptos têm morte prematura, não se sabendo com precisão qual
a influência dessa forma de transmissão na manutenção da endemia. Existe ainda
a transmissão acidental em laboratório e a transmissão pelo leite materno,
ambas de pouca significância epidemiológica. Sugere-se a hipótese de
transmissão por via oral em alguns surtos episódicos.
Ø Período de Incubação: Quando existe sintomatologia na fase
aguda, esta costuma aparecer 5 a
14 dias após a picada do inseto vetor. Quando adquirida por transfusão de
sangue, o período de incubação varia de 30 a 40 dias. As formas crônicas da doença se
manifestam mais de 10 anos após a infecção inicial.
Ø Período de Transmissibilidade: a infecção só passa
de pessoa a pessoa através do sangue, ou de modo congênito através da placenta.
A maioria dos portadores da infecção chagásica tem o parasito no sangue
circulante ou nos tecidos durante toda a vida, sendo que a parasitemia é maior
durante a fase aguda da doença. Isto significa que os indivíduos infectados
potencialmente são transmissores da doença, caso doem sangue ou órgãos, em
qualquer época de suas vidas.
Ø Susceptibilidade e Imunidade: todos os indivíduos
são suscetíveis à infecção. A imunidade humoral é demonstrada pela detecção de
anticorpos circulantes nas fases aguda e crônica da infecção. A imunidade
celular tem sido imputada como importante no desencadeamento das lesões
teciduais das formas crônicas da doença, por se tratar de fenômenos
desencadeados por auto-imunidade.
Ø Distribuição, Morbidade, Mortalidade e Letalidade: é uma doença
endêmica que não apresenta variações cíclicas ou sazonais de importância
epidemiológica. Antes de se iniciar o programa de controle da doença, a maioria
dos casos ocorriam na área rural, nos domicílios infestados por triatomíneos.
Com a migração, estima-se que, hoje, muitos dos infectados residem em área
urbana. A maioria dos indivíduos infectados são oriundos da área rural,
pertencem aos extratos sociais menos favorecidos e foram contaminados no
interior de habitações infestadas pelos insetos vetores. Na década de 70
estimou-se que o número de casos novos, a cada ano, era em torno de 100.000 e a
prevalência de 4,2%, sendo as mais altas as dos estados de Minas Gerais, Rio
Grande do Sul, Goiás, Sergipe e Bahia. O coeficiente de mortalidade foi, em
1980, de 5,2/100.000 habitantes e, em 1990, 4,1/100.000 habitantes, o que
correspondia a uma média de 6.000 óbitos por esta causa, a cada ano. Por ser
uma doença crônica, cuja sintomatologia só se manifesta décadas depois da
infecção inicial, não se dispõe de dados sobre a letalidade. · Insetos Vetores:
das 118 espécies conhecidas, 42 foram identificadas até agora no país, das
quais 30 já capturadas no ambiente domiciliar. Dessas, cinco têm especial
importância na transmissão da doença ao homem. Por ordem de importância:
Triatoma brasiliensis, Triatoma infestans, Panstrongylus megistus, Triatoma
pseudomaculata e Triatoma sordida. Outros, como Triatoma rubrovaria, no Rio
Grande do Sul, e Rhodinus neglectus, em Goiás, com a eliminação do Triatoma
infestans, vêm colonizando a habitação e tendem a assumir também algum papel na
transmissão domiciliar da Doença de Chagas. Outras espécies, por razões
diversas, devem ser consideradas. Entre essas, deve-se fazer referência ao
Triatoma vitticeps, pelas altas taxas de infecção natural (Espírito Santo, Rio
de Janeiro e Minas Gerais); Rhodinus nasatus, pela freqüência com que é
capturado, em áreas localizadas (CE e RN); e Rhodinus prolixus, pelo fato de
ser a principal espécie em alguns países (Colômbia, Venezuela) e por ter sido
identificado em focos naturais (macaubeiras), no estado do Tocantins. Na
Amazônia, as espécies mais importantes são: Rhodinus pictipes, Rhodinus
robustus, Panstrongylus geniculatus e Pastrongylus lignarius.
Aspectos Clínicos
Descrição: dentre essas
formas, destacam-se por sua importância epidemiológica as formas agudas
(indício de transmissão ativa), indeterminadas (mais freqüentes), cardíacas e
digestiva (gravidade clínica). Estima-se que as formas agudas aparentes se
manifestam em 3% dos casos em área endêmica; as formas indeterminadas em 50%;
as formas cardíacas em 30%; e as digestivas em 7 a 8%.
Fase
Aguda:
quando aparente, corresponde aos fenômenos clínicos que se estabelecem nos
primeiros dias ou meses da infecção inicial, sendo diagnosticada pelo encontro
do parasito no sangue periférico. É caracterizada por uma miocardite, na
maioria das vezes, só traduzível eletrocardiograficamente. As manifestações
gerais são de febre (pouco elevada), mal-estar geral, cefaléia, astenia,
hiporexia, edema, hipertrofia de linfonodos. Freqüentemente ocorre
hepato-esplenomegalia. Às vezes se agrava numa forma meningoencefálica,
principalmente nos primeiros meses ou anos de vida. Quando existe porta de
entrada aparente, ela pode ser ocular (Sinal de Romaña) ou cutânea (Chagoma de
Inoculação).
O Sinal de Romaña é
um edema bipalpebral (que, às vezes, se expande à face), elástico indolor, de
início geralmente brusco, coloração róseo violáceo das pálpebras, congestão
conjuntival, enfartamento dos linfonodos satélites (pré-auriculares, parotídeos
ou submaxilares), e com menos freqüência secreção conjuntival e dacrioadenite.
O Chagoma de Inoculação é uma formação cutânea ligeiramente saliente,
arredondada, eritematosa, dura, incolor, quente e circundada por edema
elástico, assemelhando-se a um furúnculo que não supura, mas que às vezes pode
exulcerar. É acompanhado de linfonodos satélites. As alterações
eletrocardiográficas estão na dependência do maior ou menor acometimento do
coração, as principais são: alargamento do espaço PR, alterações primárias de
onda T (baixa voltagem, bifasismo ou inversão), extrassístoles ventriculares.
Em
casos muito graves:
bloqueio intra-ventriculares (BRD), desnivelamento de S-T com alterações de T.
Em geral, as alterações eletrocardiográficas são reversíveis passada essa fase
da doença. O Rx de tórax pode mostrar imagem cardíaca discretamente aumentada,
logo no início do diagnóstico; como também esse achado pode ser observado
apenas passado alguns dias de doença.
Fase
Crônica:
· Forma Indeterminada: passada a fase aguda aparente ou inaparente, o indivíduo
alberga uma infecção assintomática, que pode nunca se manifestar ou se
manifestar anos ou décadas mais tarde, em uma das formas crônicas.
Forma
Cardíaca:
é a mais importante forma de limitação ao doente chagásico e a principal causa
de morte. Pode apresentar-se sem sintomatologia, mas com alterações
eletrocardiográficas (principalmente bloqueio completo de ramo direito), como
uma síndrome de insuficiência cardíaca progressiva, insuficiência cardíaca
fulminante, ou com arritmias graves e morte súbita. Seus sinais e sintomas são:
palpitação, dispnéia, edema, dor precordial, dispnéia paroxística noturna,
tosse, tonturas, desmaios, acidentes embólicos, extrassistolias, desdobramento de
segunda bulha, sopro sistólico, hipofonese de segunda bulha. As principais
alterações eletrocardiográficas são: bloqueio completo do ramo direito (BCRD),
hemibloqueio anterior esquerdo (HBAE), bloqueio AV do primeiro, segundo a
terceiro graus, extrassístoles ventriculares, sobrecarga de cavidades
cardíacas, alterações da repolarização ventricular, dentre outras. O Rx de
tórax revela cardiomegalia global discreta, moderada ou acentuada, aumento
isolado de ventrículo esquerdo, aumento biventricular, congestão vascular
pulmonar, etc.
Forma
Digestiva:
caracteriza-se por alterações ao longo do trato digestivo, ocasionadas por
lesões dos plexos nervosos (destruição neuronal simpática), com conseqüentes
alterações da motilidade e morfologia ao nível do trato digestivo, sendo o
megaesôfago e o megacólon as manifestações mais comuns. São sinais e sintomas
do megaesôfago: disfagia (sintoma mais freqüente e dominante), regurgitação,
epigastralgia ou dor retroesternal, odinofagia (dor à deglutição), soluço,
ptialismo (excesso de salivação), emagrecimento (podendo chegar a caquexia),
hipertrofia das parótidas. O megacólon se caracteriza por: constirpação
intestinal (instalação lenta e insidiosa), meteorismo, distensão abdominal,
fecaloma. Os exames radiológicos são importantes no diagnóstico da forma
digestiva. No caso de megaesôfago, há 4 grupos de alterações que vão desde uma
simples dificuldade de seu esvaziamento até ao dolicomegaesôfago, que
corresponde àqueles com grande volume, alongado, atônico, dobrando-se sobre a
cúpula diafragmática, produzindo sombra paracardíaca direita ao simples exame
de tórax. O megacólon é classificado em três grupos, de acordo com a capacidade
de exoneração do meio de contraste, quando se realiza o enema opaco. ·
Forma
Mista:
o paciente pode ter associação da forma cardíaca com a digestiva e também
apresentar mais de um mega. · Forma Nervosa e de outros megas: apesar de
aventadas não parecem ser manifestações importantes destas infecções.
Forma
Congênita:
sobressaem, dentre os sinais clínicos, a hepatomegalia e esplenomegalia,
presente em todos os casos, icterícia, equimoses, convulsões decorrentes da
hipoglicemia. Não há relato de ocorrência de febre.
Diagnóstico Diferencial :
Fase
Aguda:
no que diz respeito às manifestações gerais deve-se fazer diagnóstico
diferencial com a febre tifóide, leishmaniose visceral, esquistossomose
mansônica aguda, mononucleose infecciosa, toxoplasmose, dentre outras
enfermidades febris. O sinal de Romaña deve ser diferenciado de múltiplas
manifestações oculares, a exemplo das conjuntivites, edema de Quincke, celulite
orbitária, etc.; o chagoma de inoculação da furunculose. A forma
meningoencefálica comporta diagnóstico diferencial com as determinadas por
outras etiologias.
Fase
Crônica:
a miocardiopatia chagásica tem que ser diferenciada de muitas outras
cardiopatias. Os dados epidemiológicos, a idade do paciente, os exames
sorológicos, eletrocardiográficos e radiológicos, em geral, permitem a perfeita
caracterização dessa entidade clínica.
Forma
Digestiva:
diferenciar de megas causados por outras etiologias.
Forma
Congênita:
diferenciar da Sífilis e da Toxoplasmose. · Complicações
Fase
Aguda:
a cardiopatia chagásica aguda se manifesta como em outras miocardites. Nos
casos mais graves, há cardiomegalia acentuada que se deve a miocardite e
derrame pericárdico com insuficiência cardíaca congestiva. É algumas vezes
súbita e de curso letal. Esses casos com maior expressão clínica ocorrem, via
de regra, em crianças abaixo de três anos de idade, com parasitemia elevada e
comprometimento do coração e do sistema nervoso central. A letalidade é em
torno de 2 a
7%.
Fase
Crônica:
a doença de Chagas crônica apresenta três formas: indeterminada, cardíaca e
digestiva. As formas prevalentes, em nosso meio, são a cardiopatia, a
esofagopatia e colopatias chagásicas, sendo a primeira, a forma mais importante
de limitação, dano e morte. Os casos mais severos de cardiopatia chagásica
crônica (CCC), ocorrem mais freqüentemente nas 3ª e 4ª décadas de vida, sendo importante
causa de morte em áreas endêmicas. As complicações são: insuficiência cardíaca
congestiva (com predominância do tipo direto), derrame pericárdico e arritmias
(extra-sístoles ventriculares, bloqueios completos de ramo direito associados
ou não a um hemi-bloqueio anterior esquerdo e, especialmente grave e com pior
prognóstico, os bloqueios aurículo-ventriculares completos de ramo esquerdo e
extra sístoles ventriculares multifocais). Além das arritmias, outras
manifestações correspondem a aneurisma de ponta e fenômenos trombo-embólicos.
As complicações digestivas do esôfago mais freqüentes são: esofagite por
estase, desnutrição, neoplasias, rompimento do esôfago, fístula e alterações
pulmonares devidas à regurgitação. As complicações ligadas ao colo são: volvos
e torções do mega e fecalomas com obstruções agudas.
Tratamento: todo indivíduo com
infecção chagásica deve ter acesso a um serviço médico capaz de fazer os
diagnósticos clínico, laboratorial e epidemiológico e identificar a fase da
doença para definição do tratamento adequado, quando necessário. O manejo
clínico do paciente chagásico, particularmente das formas cardíacas, é
importante, pois quando bem conduzido e iniciado precocemente pode resultar na
elevação da expectativa de sobrevivência.
Tratamento
Específico:
o objetivo é o de suprimir a parasitemia e, conseqüentemente, seus efeitos
patogênicos ao organismo. Esse tratamento está indicado na fase aguda da doença
em casos congênitos, na reativação da parasitemia por imunossupressão (AIDS e outras
doenças imunossupressoras), transplantado que recebeu órgão de doador
infectado, quando a supressão da parasitemia ou a prevenção do seu aparecimento
tem ação benéfica para os pacientes. Recentemente, reuniu-se no IOC/FIOCRUZ, um
Comitê Internacional composto de especialistas de todos os países do continente
sul americano, sob o patrocínio da OMS e OPS, o qual fez recomendações
específicas para o tratamento da doença de Chagas crônica, baseado em dezenas
de experiências envolvendo centenas de casos da forma crônica. Está
contra-indicado para gestantes, porque além de não impedir a infecção
congênita, as drogas podem causar danos ao concepto. Esquemas Terapêuticos: 1.
Benzonidazol: adultos: 5 mg/Kg/dia, durante 60 dias. Crianças: 5-10 mg/Kg/dia,
durante 60 dias. A quantidade diária deve ser tomada em duas ou três ocasiões,
com intervalos de oito ou doze horas. Efeitos colaterais: cefaléias, tonturas,
anorexia, perda de peso, dermatites, lassidão, depleção das células da série
vermelha. 2. Nifurtimox: adultos: 8-10 mg/Kg/dia, durante 60 a 90 dias. Crianças: 15
mg/Kg/dia, durante 60 a
90 dias. A quantidade diária deve ser tomada em três ocasiões, com intervalos
de oito horas (no momento está fora do mercado).
Efeitos
colaterais:
anorexia, emagrecimento, parestesias, polineuropatias periféricas, depleção
medular.
Tratamento Sintomático
Formas
cardíacas:
o manejo da cardiopatia chagásica exige um conhecimento específico das
respostas que as drogas utilizadas na prática cardiológica apresentam neste
tipo de doente. Vale ressaltar que o início precoce e um tratamento bem
conduzido beneficiam significativamente o prognóstico de grandes parcelas de
pacientes, que podem não só aumentar sua sobrevivência como ter uma melhor
qualidade de vida, desenvolvendo suas atividades habituais desde que não
redundem em grandes esforços físicos. As drogas utilizadas são as mesmas que se
usam em outras cardiopatias: cardiotônicos, diuréticos, antiarrítmicos,
vasodilatadores, etc. Em alguns casos, indica-se a implantação de marcapasso,
com resultados bastante satisfatórios, na prevenção da morte súbita. Formas
Digestivas: dependendo do estágio em que a doença é diagnosticada, indica-se
medidas mais conservadoras (uso de dietas, laxativos ou lavagens). Em estágios
mais avançados, impõe-se a dilatação ou correção cirúrgica do órgão afetado.
Diagnóstico Laboratorial
Parasitológico:
Ø Exame a fresco
Ø Gota espessa
Ø Esfregaço corado
Ø Creme leucocitário
Ø Xenodiagnóstico
Ø Métodos Imunológicos:
Ø Hemaglutinação
indireta
Ø Imunofluorescência
Ø ELISA
Os métodos
parasitológicos na prática são utilizados para diagnóstico da fase aguda,
quando a parasitemia é intensa. As sorologias que detectam IgM
(imunofluorescência e hemaglutinação) também são utilizadas para diagnóstico
dafase aguda, entretanto só deve firmar diagnóstico de forma aguda com o
encontro de parasito no sangue periférico. Na fase crônica, utiliza-se mais
freqüentemente os métodos de detecção de anticorpos circulantes (IgG) e dentre
os citados, os mais utilizados são o ELISA, a imunofluorescência e a
hemaglutinação indireta. A fixação de complemento, que no passado era o exame
de escolha, hoje não deve ser executada pelas dificuldades inerentes à sua
técnica.
Vigilância Epidemiológica
A Doença de Chagas no
Brasil, durante muitos anos, teve como principal forma de transmissão a
vetorial e incidia em grande extensão territorial de forma endêmica, com
milhares de indivíduos se infectando anualmente, atingindo uma magnitude que
inviabilizava a vigilância sistemática de casos. Naquela época, a intervenção
do Ministério da Saúde ficou centrada no combate ao vetor e no estímulo ao
controle das transfusões de sangue, visando diminuir drasticamente os
coeficientes de morbi- mortalidade por essa infecção. Por outro lado, como as
formas crônicas da doença, particularmente as formas cardíacas (mais graves e
mais freqüentes da infecção), não dispõem de tratamento específico, limitam a
atuação dos órgãos de Vigilância Epidemiológica. Com o avanço do conhecimento,
no que diz respeito ao manejo da cardiopatia chagásica e os bons resultados
obtidos pelo Programa de Controle da Doença de Chagas, incluiu-se essa doença
no Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (Portaria do MS nº 1.100 de 23
de maio de 1996), respeitando-se as características clínicas e epidemiológicas
que lhes são próprias e que impõem métodos e técnicas diferenciadas de
vigilância. Os objetivos da vigilância epidemiológica da Doença de Chagas são:
· detectar todos os casos agudos (por transmissão vetorial, transfusional ou
outra(s) forma(s)) para a adoção das medidas de controle adequadas; · realizar
inquéritos escolares visando o conhecimento de áreas onde continua ocorrendo a
transmissão vetorial.
Os métodos, técnicas
e organização operacional destes inquéritos estão sistematizados no Manual de
Normas Técnicas para Inquérito Sorológico para Avaliação do Programa de
Controle da Doença de Chagas, da Fundação Nacional de Saúde/MS; dar
continuidade ao programa de controle de vetores domiciliares, que deve
priorizar a vigilância entomológica exercida pela própria população, de forma
contínua, e controlada pela rede de serviços de saúde. A metodologia está
contida no Manual de Controle da Doença de Chagas, da FNS/MS. · impedir a
transmissão transfusional; e impedir a expansão da doença na Amazônia, área
considerada indene ou de baixíssima endemicidade.
Notificação Tipos de Dados:
Todos os casos agudos
(principalmente por transmissão vetorial ou transfusional) devem ser
notificados à equipe de vigilância mais próxima do local de ocorrência da
transmissão, objetivando uma investigação pronta e a adoção de medidas de
controle.
Os casos crônicos não são de notificação compulsória. Para se ter conhecimento da magnitude da doença e das áreas de transmissão ativa, inquéritos amostrais devem ser realizados.
Os casos crônicos não são de notificação compulsória. Para se ter conhecimento da magnitude da doença e das áreas de transmissão ativa, inquéritos amostrais devem ser realizados.
Os óbitos devem ser
analisados pela vigilância epidemiológica.
Resultados de exames
laboratoriais.
Fontes:
Unidades
de saúde:
particularmente os hospitais que internam os casos agudos.
Estatísticas de internações por doença de Chagas.
Estatísticas de internações por doença de Chagas.
Laboratórios: hemocentros,
serviços de hemoterapia (que devem fornecer sistematicamente os resultados das
sorologias à vigilância epidemiológica), LACENS e outros laboratórios da rede
de saúde.
Declarações de óbitos
Resultados de inquéritos sorológicos.Resultados dos inquéritos entomológicos.
Fluxos: os fluxos de
informações devem ser desenhados de acordo com os sistemas locais e estaduais
de saúde, em articulação com as Coordenações Regionais da FNS. Os casos agudos
têm que ser notificados ao Ministério da Saúde/FNS/Coordenação Controle de
Doenças Transmitidas por Vetores.
Definição de Caso 1
Forma
aguda:
indivíduos em período inicial da doença, sintomático, com parasitemia e porta
de entrada demonstrável ou não.
Forma
indeterminada:
indivíduo infectado sem manifestações clínicas, eletrocardiográficas ou
radiológicas do tórax e aparelho digestivo, diagnosticado através de dois
exames sorológicos com técnicas diferentes ou um exame parasitológico positivo
(xenodiagnóstico, creme leucocitário, exame direto, etc.)
Forma
cardíaca:
indivíduo com miocardiopatia e dois ou mais exames diferentes, positivos ou um
exame parasitológico.
Forma
digestiva:
paciente com algum tipo de mega e dois exames sorológicos ou um exame
parasitológico positivo.
Forma
mista:
paciente com miocradiopatia e algum tipo de mega e dois exames sorológicos ou
um exame parasitológico positivo.
Forma
congênita:
recém-nascido, filho de mãe chagásica, com hepatoesplenomegalia, parasito no
sangue periférico e/ou reações sorológicas que detectam IgM positivas.
Investigação
Epidemiológica De Casos: a investigação epidemiológica se impõe, no atual
estágio de desenvolvimento do Programa de Controle da Doença de Chagas, em
todos os casos agudos, seja de transmissão vetorial, seja de transmissão
transfusional. No caso de transmissão vetorial, a investigação deve localizar o
domicílio, anexos (galinheiros, chiqueiros, paióis, etc) ou mata próxima onde
ocorreu a infecção e, imediatamente, proporcionar a realização de um inquérito
entomológico da área, visando definir qual a população de triatomíneos e a
adoção das medidas de controle pertinentes. Em situações de transmissão
transfusional, localizar a unidade de hemoterapia responsável pela ocorrência
e, em articulação com a Vigilância Sanitária da área, adotar as medidas
adequadas para prevenção de outros casos. Não existe indicação, no momento,
para investigação de casos crônicos, em virtude da infecção inicial ter
ocorrido anos ou décadas antes do diagnóstico, o que inviabiliza a adoção de
qualquer medida de vigilância, prevenção ou controle que venha beneficiar o
paciente ou a comunidade.
De
Surtos:
dificilmente ocorrem surtos agudos de Doença de Chagas no atual estágio de
atuação do programa, a não ser em situações especialíssimas como as registradas
em Belém e a que houve em uma fazenda na Paraíba, quando durante uma festa,
houve ingestão coletiva de caldo de cana contaminado por fezes de triatomíneo.
Em situações de ocorrência de mais de um caso de forma aguda, o nível nacional
deve ser imediatamente comunicado, a investigação deve ser realizada para
imediata determinação da fonte de infecção e pronta adoção das medidas de
controle e atenção à saúde dos pacientes.
Inquéritos
Sorológicos:
inquéritos sorológicos em escolares devem ser realizados nas áreas endêmicas
por ser uma forma de investigação epidemiológica importante para avaliar os
resultados da ação antivetorial e orientar quanto à necessidade ou não de
intensificação das ações de controle dos triatomíneos domiciliares (vide manual
já citado).
Vigilância
Entomológica:
a vigilância entomológica é de fundamental importância para se obter o controle
da transmissão vetorial da Doença de Chagas e deve ser contínua, permanente,
com mobilização comunitária em toda a área endêmica e naquelas regiões onde
espécies secundárias ensaiam um processo de domiciliação. Deve-se utilizar
biossensores em todas as casas sob risco de domiciliação de triatomíneos.
Inquéritos
Entomológicos:
de acordo com a situação epidemiológica da área, inquéritos entomológicos podem
ser realizados como parte da investigação de casos ou surtos, visando elucidar
a ocorrência de transmissão ativa e orientar as medidas de controle.
Conduta
Frente aos Casos Forma Aguda:confirmar o diagnóstico de acordo com a
definição de caso; notificação imediata ao serviço de vigilância mais próximo; proceder
investigação epidemiológica de acordo com roteiro do item anterior; adoção de
medidas de controle; e assistência médica adequada ao paciente.
Formas
Crônicas
Informação
do Diagnóstico ao Paciente: em virtude do prognóstico reservado de uma boa parte
das formas crônicas, particularmente das formas cardíacas, faz-se necessário
diagnosticar criteriosamente a doença e sua forma clínica, objetivando informar
corretamente o paciente, visto que os residentes de área endêmica conhecem
perfeitamente o prognóstico da doença. O diagnóstico deve ser comunicado por
profissional treinado que tenha condições de conversar com o paciente e
orientá-lo a respeito dos cuidados a serem tomados de acordo com as
manifestações clínicas de cada um.
Atenção
Médica:
o paciente deve ser encaminhado a um serviço de saúde com profissional
capacitado e infra-estrutura de atendimento adequada para dar assistência ao
caso, de acordo com a complexidade da forma de apresentação clínica, e manter
acompanhamento periódico, adequado à gravidade de cada paciente.
Forma
Congênita:
fazer tratamento específico e acompanhamento médico da evolução clínica do caso
periodicamente para verificar se irá ou não desenvolver alguma das formas
clínicas da doença.
Conduta
Frente a um Surto:
a ocorrência de surtos da doença de Chagas é rara. As referências existentes
estão associadas a formas agudas da doença, com transmissão por via oral pela
ingestão de alimentos contaminados, contaminação acidental ou por via
transfusional. Deve-se proceder à investigação epidemiológica abordando
levantamento do número de casos, fonte de infecção, grupo etário, pesquisa
entomológica nas unidades domiciliares (intra e peridomicílio) e arredores
(incluindo identificação do tipo de tripanossoma e teste de precipitina),
sorologia e exame parasitológico do(s) caso(s) e familiares, transfusões
sangüíneas e internações hospitalares. Na ocasião é importante o suporte de
laboratório para confirmação, tanto do diagnóstico etiológico quanto
entomológico, para estabelecer medidas quanto à possibilidade de tratamento e
acompanhamento dos casos além das ações de controle apropriadas. · Análise dos
Dados: os dados coletados, particularmente aqueles provenientes dos inquéritos
sorológicos e entomológicos, devem ser prontamente analisados de acordo com a
metodologia proposta nos protocolos de investigação. Os dados coletados nas
investigações epidemiológicas de casos agudos devem ser analisados para
orientar a adoção das medidas de controle. Os casos crônicos encontrados nas
áreas são de difícil análise, em decorrência da migração, o que significa que
certamente não refletem a realidade da transmissão da doença no local e,
conseqüentemente, não servem de parâmetro para a adoção de medidas de
vigilância e controle.
Medidas de Controle
Devido ao ciclo de
transmissão da infecção, as medidas de controle são dirigidas ao combate do
vetor e ao controle de qualidade do sangue transfundido. · Controle da
Transmissão Vetorial Melhoria ou Substituição de Habitações: a transmissão
vetorial pode ser controlada através da melhoria ou substituição de habitações
de má qualidade que propiciam a domiciliação e permanência dos triatomíneos no
habitat humano (casas de pau a pique, de sopapo, de adobe sem reboco, etc), por
casas de paredes rebocadas, sem frestas, que dificultem a colonização dos
vetores. Prioriza-se a melhoria de habitações onde se encontram espécies
nativas, presentes, em alta densidade, em ecótopos naturais, em especial o
Triatoma brasiliensis e o Triatoma pseudomaculata.
Controle Químico: pelo emprego regular e sistematizado de
inseticidas de ação residual nas habitações, sabidamente infestadas por
triatomíneos. Portanto, faz-se necessária a realização de pesquisa entomológica
antes de se iniciar o rociamento das habitações. Os objetivos do controle
químico variam de acordo com as espécies e o estágio de domiciliação do vetor.
Se a espécie é estritamente domiciliar, o objetivo é o da sua completa
eliminação, como é o caso do Triatoma infestans, cuja proposta hoje é a de
eliminá-lo em todos os países que compõem o Cone Sul. No caso do Pastrongylus
megistus, Triatoma brasiliensis, Triatoma pseudomaculata, e Triatoma sordida, o
controle a ser alcançado é a manutenção dos intradomicílios livres de colônias,
visto que a existência de focos silvestres possibilitam a reinfestação das
habitações.
Com relação às outras
espécies existentes, o objetivo é o de prevenir a colonização dos domicílios
através de rigorosa vigilância entomológica. Controle Biológico: o uso de
inibidores do crescimento, feromônios, microorganismos patógenos e
esterilização induzida estão sendo estudados, mas a utilização sistemática
desses métodos ainda não é, até aqui, aplicável na prática. Controle da
Transmissão Transfusional: basicamente consiste na fiscalização das unidades de
hemoterapia para que se faça o controle de qualidade do sangue a ser
transfundido, através da triagem sorológica de todos os doadores de sangue,
com, pelo menos, duas técnicas de sensibilidade. Esta triagem deve ser feita
não só para Doença de Chagas, como para todas as outras doenças transmitidas
pelo sangue (AIDS, Sífilis, Malária em áreas endêmicas, e Hepatites Virais
etc). Outra forma indicada, mas que não tem tido boa aceitação por modificar a
coloração do sangue, é a de se adicionar Violeta de Genciana, na concentração
de 1:4.000, no sangue, 24 horas antes desse ser transfundido, visto que este
produto elimina os parasitos. Controle de Outras Formas de Transmissão: o
controle da transmissão em laboratório deve ser feito através de rigoroso uso
das normas de biossegurança. A transmissão pelo leite materno, apesar de
descrita na década de 30, não tem sido diagnosticada e, possivelmente, não tem
muito significado epidemiológico. Não existe forma de prevenção da forma
congênita.
Situação atual da
doença
A doença de Chagas é
uma doença transmitida, principalmente, por triatomíneos (insetos
hematófagos*), conhecidos popularmente como barbeiros, e apresentava uma
elevada incidência em nosso país, estimada, no final da década de 70, em cerca
de 100 mil casos novos por ano.
Hoje, com a estratégia de monitoramento
entomológico para identificar a presença do vetor e desencadear as ações de
combate utilizando inseticidas específicos, assim como as melhorias
habitacionais realizadas nas áreas endêmicas, essa doença encontra-se sob
controle. Este fato pode ser constatado a partir do consolidado dos inquéritos
sorológicos para a doença de Chagas realizados sistematicamente entre escolares
(7-14 anos de idade) de todos os estados endêmicos, no período de 1989 a 1999. Nesse
consolidado, de 244.770 amostras colhidas, apenas 329 foram positivas,
resultando em uma prevalência média geral de 0,13%.
Com esses resultados e a redução da área onde
é encontrado o Triatoma infestans, a Comissão Internacional de Especialistas
constituída pela OPAS e pelos países do Cone Sul, com a finalidade de avaliar a
situação epidemiológica de cada país, conferiu o certificado de interrupção da
transmissão vetorial pelo T. infestans a oito estados brasileiros, São Paulo,
Rio de Janeiro, Paraíba, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais e
Pernambuco. Os estados do Piauí e Rio Grande do Sul, onde os estudos estão
sendo concluídos, serão certificados brevemente e os estados da Bahia,
Tocantins e Paraná, serão certificados a partir de 2003.
FONTE
MINISTÉRIO DA SAÚDE, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância Epidemiológica, DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS. GUIA DE BOLSO, 6ª edição revista Série B. Textos Básicos de Saúde, brasília / DF, 2006
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