TOXICOLOGIA GERAL
CONCEITOS BÁSICOS PARTE 2
DEPTO.
ANÁLISES CLÍNICAS E TOXICOLÓGICAS
FACULDADE
DE FARMÁCIA
UNIVERSIDADE FEDERAL
DE MINAS GERAIS
Profa. Edna Maria Alvarez Leite, Profa. Leiliane Coelho André Amorim
6) Extrapolação dos dados toxicológicos
Os testes toxicológicos
que utilizam animais de laboratório são realizados em condições rigorosamente
padronizadas visando estabelecer os possíveis efeitos tóxicos das substâncias
em humanos a partir da extrapolação dos dados encontrados.
A finalidade dos
Testes Toxicológicos é portanto fornecer dados que possam ser utilizados para
avaliação do risco no uso da substância química para o homem e estabelecer
Limites de Segurança para a exposição química.
Em muitos casos os estudos com animais
permitem prognosticar os efeitos tóxicos das substâncias químicas no homem.
Contudo, é importante compreender que os modelos de animais experimentais
apresentam limitações e que a exatidão e fidedignidade de uma predição
quantitativa de toxicidade no homem dependem de certas condições, como a
espécie de animal escolhida, o desenho dos experimentos e os métodos de
extrapolação dos dados de animais ao homem.
O problema mais difícil na extrapolação dos
dados de animais para o homem é a conversão de uma espécie a outra. Para a
maior parte das substâncias químicas a patogênese da intoxicação é idêntica no
homem e outros mamíferos, razão pela qual os sinais de intoxicação também são
iguais. Consequentemente, são mais comuns as diferenças quantitativas na
resposta tóxica do que as qualitativas.
Embora o homem possa ser mais sensível que
certos animais de laboratório, também há muitos casos nos quais algumas
espécies de animais são mais sensíveis que o homem. Por exemplo, o rato é mais
sensível à atropina, já o cão tolera a atropina em dose 100 vezes superior a
dose letal para o homem. Entretanto o cão é mais sensível que o homem ao ácido
cianídrico.
Para estabelecer um limite de exposição para
as substâncias químicas a partir de dados experimentais em animais utiliza-se
um fator de segurança (FS), afim de resolver as incertezas da extrapolação.
O qual é
estabelecido a partir da fórmula:
LT = DNEO
FS
Em
geral, a magnitude do fator de segurança dependerá:
Ø natureza do efeito
tóxico
Ø tipo e tamanho da
população exposta
Ø quantidade e
qualidade dos dados toxicológicos
Um fator de 2 a 5
ou menos pode-se considerar suficiente quando o efeito contra o qual se protege
aos indivíduos ou à uma população não se considera muito grave, quando somente
um pequeno grupo de trabalhadores está sujeito à uma exposição provável e
quando a informação toxicológica se deriva de dados humanos.
Por outro lado,
pode ser necessário recorrer a um fator de seguridade de 1000, ou mais quando o
possível efeito é muito grave, quando tem que proteger uma população em geral e
quando os dados toxicológicos se derivam de experimentos limitados com animais
de laboratório.
Em relação à maior parte dos aditivos
alimentares que não se consideram carcinogênicos, aceita-se dividir o DNEO em
animais por 100, afim de determinar a Ingetão Diária Aceitável (IDA) no homen.
Nos casos dos praguicidas e certas substâncias químicas ambientais se utilizam
fatores de segurança que vão de menos de 100 a mais de 1000. Nos casos de
algumas exposições ocupacionais e certos contaminantes ambientais são propostos
fatores de segurança muito pequenos, como 2 a 5. Também são propostos fatores
de segurança para as substâncias carcinogênicas que vão de 100 a 5000.
Fases da Intoxicação
Desde o momento
em que o agente químico entra em contato com o agente biológico, até o momento
em que a intoxicação é visualizada através dos sinais e sintomas clínicos,
ocorrem uma serie de etapas metabólicas que compõem a chamada Fases da
Intoxicação que são quatro:
· Fase de Exposição,
· Fase Toxicocinética
· Fase Toxicodinâmica
· Fase Clínica
É essencial
lembrar que:
Þ Mais do que da dose
administrada, a resposta é função da concentração do AT que interage com o
receptor biológico; e que, a concentração do AT no sítio de ação é dependente
das duas primeiras fases da intoxicação.
1) Fase de Exposição
Exposição é a medida do contato entre o AT e a superfície corpórea do organismo e sua intensidade depende de fatores, tais como:
Ø Via ou local de exposição
As principais vias de exposição, através das quais os AT são introduzidos no organismo são:
- via gastrintestinal (ingestão)
- via pulmonar (inalação)
- via cutânea (contato)
Embora não tão importante para a Toxicologia como estas três, existe também a via parenteral. A via de introdução influi tanto na potência quanto na velocidade de aparecimento do efeito tóxico. A ordem decrescente de eficiência destas vias é: via endovenosa > pulmonar > intraperitoneal > subcutânea > intra muscular > intra-dérmica > oral, cutânea.
Estas vias ganham maior ou menor importância, de acordo com a área da Toxicologia em estudo. Assim, a via pulmonar e a cutânea são as mais importantes na Toxicologia Ambiental e Ocupacional, a via gastrointestinal na Toxicologia de Alimentos, de Medicamentos, em casos de suicídios e homicídios, e a via parenteral tem certa importância na Toxicologia Social e de Medicamentos (Farmacotoxicologia).
Ø Duração e freqüência da exposição
A duração de uma
exposição é importante na determinação do
efeito tóxico, assim como na intensidade destes. Geralmente a exposição
pode ser classificada, quanto à duração em:
-
exposição aguda: exposição única ou múltipla que ocorra em um período
máximo de 24 horas
- exposição subaguda: aquela que
ocorre durante algumas semanas (1 mês ou mais)
- exposição sub-crônica: aquela que
ocorre durante alguns meses (geralmente por 3 meses)
- exposição crônica: ocorre durante toda a vida.
Quanto à frequência da exposição observa-se que, geralmente, doses ou concentrações fracionadas podem reduzem o efeito tóxico, caso a duração da exposição não seja aumentada. Assim, uma dose única de um agente que produz efeito imediato e severo, poderá produzir menos do que a metade ou nenhum efeito, quando dividida em duas ou mais doses, administradas durante um período de várias horas ou dias. No entanto, é importante ressaltar que a redução do efeito provocado pelo aumento de freqüência (ou seja, do fracionamento da dose) só ocorrerá quando:
- a velocidade de eliminação é maior
do que a de absorção, de modo que os processos de biotransformação e/ou
excreção ocorram no espaço entre duas exposições;
- o efeito tóxico pela substância é parcial ou totalmente revertido antes da exposição seguinte.
Se nenhuma destas situações ocorrerem, o aumento de freqüência resultará em efeitos tóxicos crônicos.
2) Fase Toxicocinética
Nesta fase tem-se a ação do organismo sobre o agente tóxico, procurando diminuir ou impedir a ação nociva da substância sobre ele. É de grande importância, porque dela resulta a quantidade de AT disponível para reagir com o receptor biológico e, consequentemente, exercer a ação tóxica.
A fase toxicocinética é constituída dos seguintes processos:
- absorção
- distribuição
- eliminação: biotransformação e excreção
Pode-se notar que nesta fase o agente tóxico deverá se movimentar pelo organismo e para tal terá que, freqüentemente, transpor membranas biológicas. Assim, é muito importante o conhecimento dos fatores que influem no transporte das substâncias químicas pelas membranas.
2.1) Fatores que influem no transporte por membranas
Estes fatores podem ser agrupados em
duas classes distintas:
Ø Fatores relacionados com a membrana
Ø
- Estrutura da membrana
- Espessura da membrana
- Área da membrana
Destes 3 fatores, destaca-se a estrutura da membrana. Sabe-se que a membrana biológica é constituída de camada lipídica bimolecular, contendo em ambos os lados, moléculas de proteínas que penetram e às vezes transpõem esta camada.
Os ácidos graxos presentes na camada lipídica não possuem uma estrutura cristalina rígida, ao contrário, na temperatura fisiológica eles tem características quase fluídas. Portanto, o caráter fluído das membranas (e portanto sua permeabilidade) é determinado principalmente pela estrutura e proporção relativa de ácidos graxos insaturados presentes na região. Este modelo denominado de “mosaico fluído”, foi proposto por SINGER & NICOLSON em 1972 e é o mais aceito atualmente.
Ø
Fatores relacionados com a
substância química
Lipossolubilidade:
Devido à constituição lipoprotéica das membranas biológicas, as substâncias químicas lipossolúveis, ou seja, apolares, terão capacidade de transpo-la facilmente, pelo processo de difusão passiva. Já as substâncias hidrossolúveis não transporão estas membranas, a não ser que tenham pequeno tamanho molecular e possam ser filtradas, através dos poros aquosos.
Coeficiente de partição óleo/água:
É o parâmetro que permite avaliar o grau de lipossolubilidade das substâncias químicas. Este coeficiente é obtido ao se agitar um agente químico em uma mistura de solvente orgânico e água (em condições de pH e temperatura controladas). As substâncias polares, hidrossolúveis, se concentram na fase aquosa e as apolares, lipossolúveis, na fase orgânica. Quanto maior for a concentração da substância na fase orgânica, maior será a sua lipossolubilidade. Ex.: coeficiente de partição n-octanol/água a 37o C e pH 7,4 de algumas substâncias:
* clorpromazina = 79,7;
* AAS = 11,7;
* paracetamol = 1,79.
Grau de ionização ou de dissociação:
A maioria dos
agentes tóxicos são ácidos fracos ou bases fracas que possuem um ou mais grupos
funcionais capazes de se ionizarem. A extensão desta ionização dependerá do pH
do meio em que a substância está presente e do seu próprio pKa. É importante
relembrar que a forma ionizada é polar, hidrossolúvel e com pouca ou nenhuma
capacidade de transpor membranas por difusão passiva. O grau de ionização das
substâncias, em diferentes pH, poderá ser obtido através da aplicação da
fórmula de Henderson-Hasselbach, para ácidos fracos e bases fracas.
Ácidos:
[HA]
HA H+ + A- ® pKa = pH +
log ¾¾¾¾¾ assim,
[H+][A-]
[HA]
¾¾¾¾ = 10 pKa-pH
[H+][A-]
Bases:
[RNH3+]
R - NH3+ RNH2 + H+ ® pKa = pH + log ¾¾¾¾¾¾ assim,
[RNH2]
[ RNH3+]
¾¾¾¾¾- = 10 pKa
- pH
[ RNH2]
Quando o pH do meio é igual ao pKa de um composto, a metade deste estará na forma ionizada e a outra metade na forma não-ionizada. Importante ressaltar que o pKa sozinho não indica se um composto tem caráter ácido ou básico, já que os ácidos fracos tem pKa elevado, mas as bases fortes também o tem. Da mesma maneira os ácidos fortes tem pKa baixo assim como as bases fracas.
2.2) Absorção
É a passagem do AT do meio externo para o meio interno, atravessando membranas biológicas. O meio externo na absorção pode ser o estômago, os alvéolos, o intestino, ou seja, dentro do organismo, mas fora do sangue. Existem três tipos de absorção mais importantes para a Toxicologia.
2.2.1) Absorção pelo trato gastrintestinal (TGI) ou
Oral
Uma vez no TGI, um agente tóxico poderá sofrer absorção desde a boca até o reto, geralmente pelo processo de difusão passiva. São poucas as substâncias que sofrem a absorção na mucosa bucal, principalmente porque o tempo de contato é pequeno no local. Estudos feitos experimentalmente, no entanto, mostram que cocaína, estricnina, atropina e vários opióides podem sofrer absorção na mucosa bucal. Esta absorção é dependente, principalmente, do coeficiente de partição óleo/água (quanto maior este coeficiente mais fácil a absorção) e resulta em níveis sangüíneos elevados, já que as substâncias não sofrerão a ação dos sucos gastrintestinais.
Não sendo absorvido na mucosa bucal, o AT tenderá a sofrer absorção na parte do TGI onde existir a maior quantidade de sua forma não-ionizada (lipossolúvel). Para se conhecer a fração de AT não ionizado, ou aquela apta a sofrer absorção por difusão passiva, é importante a utilização da fórmula de Handerson-Hasselbach. De maneira geral, os ácidos fracos não se ionizam em meio ácido, como o do estômago, sendo assim absorvidos na mucosa gástrica, enquanto as bases fracas por não se ionizarem no pH intestinal, serão absorvidas no local. Exemplo: salicilatos e barbitúricos são absorvidos, principalmente, no estômago e aminopirina, quinina, anilina, serão absorvidos no intestino.
Embora a grande maioria dos AT sofram absorção no TGI por difusão passiva, existem alguns que serão absorvidos por processo especial, mais precisamente por transporte ativo. Exemplo: o chumbo é absorvido por transporte ativo e utiliza o sistema que transporta o cálcio; o tálio é transportado pelo sistema carregador responsável pela absorção de Fe, etc.
Ø Fatores que influem na absorção pelo TGI
Além das propriedades físico-químicas dos AT, outros fatores poderão influir na absorção:
· administração de EDTA: parece que este quelante altera a permeabilidade da membrana, por seqüestrar o cálcio presente na sua estrutura, facilitando assim, de maneira inespecífica, a absorção de ácidos, bases e substâncias neutras. Existe sempre entretanto, no caso da ingestão de minerais, a possibilidade do EDTA quelar o AT, o que resultaria em uma menor absorção do mesmo
· conteúdo estomacal: a
absorção será favorecida se o estômago estiver vazio, devido ao maior contato
do AT com a mucosa.
· secreções gastrintestinais,
sua concentração enzimática, e sua acidez: estes sucos digestivos, seja por sua
acidez iônica, seja por ação enzimática, podem provocar mudanças na atividade
ou na estrutura química do agente, alterando assim a velocidade de absorção.
Ex.: sabe-se que o pH estomacal das crianças não é tão ácido como o dos
adultos. Isto implica em um desenvolvimento maior de microorganismos,
principalmente Encherichia coli,
microorganismo que reduz, no estômago, o nitrato à nitrito. Como as crianças
possuem dietas ricas em nitratos, estes serão reduzidos a nitritos que são
rapidamente absorvidos pela mucosa estomacal, causando, então,
metemoglobinemia.
· mobilidade intestinal: o
aumento da mobilidade intestinal diminuirá o tempo de contato do agente tóxico
com a mucosa e, consequentemente, a absorção neste local.
· efeito de primeira passagem
pelo fígado: as substâncias absorvidas no TGI entram na circulação porta e
passam pelo fígado, podendo ser biotransformadas de maneira mais ou menos
intensa. Através da secreção biliar serão excretadas no intestino, donde serão
reabsorvidas ou excretadas pelas fezes. É o também chamado de ciclo
entero-hepático. Este efeito pode ser responsável pela menor biodisponibilidade
de algumas substâncias, quando estes são administradas por via oral.
Tabela 1: Diferenças fisiológicas entre homens e mulheres que podem afetar a absorção de agentes tóxicos pelo TGI
Parâmetro
|
Diferença
fisiológica
|
Diferença
na absorção
|
pH suco
gástrico
|
gestante>mulher>homem
|
altera absorção oral
|
motilidade
intestinal
|
< nas
gestantes
|
> absorção
|
esvaziamento
gástrico
|
prolongado nas
gestantes
|
> absorção
|
Alguns dos fatores que influem na absorção pelo TGI podem variar de acordo com o sexo e, no sexo feminino, entre as gestantes e não gestantes. Este fato é importante na avaliação da intensidade de absorção de xenobióticos por essa via. A tabela 1 mostra as principais diferenças fisiológicas existentes entre homens e mulheres, gestantes e não gestantes, que podem influenciar a absorção pelo TGI.
2.2.2) Absorção Cutânea
A pele íntegra é uma barreira efetiva contra a penetração de substâncias químicas exógenas. No entanto, alguns xenobióticos podem sofrer absorção cutânea, dependendo de fatores tais como a anatomia e as propriedades fisiológicas da pele e propriedades físico-químicas dos agentes.
A pele é formada por duas camadas, a saber: epiderme e derme. A epiderme, que é a camada mais externa da pele é constituída por cinco regiões distintas:
região córnea: possui duas sub-camadas, o extrato córneo
descontínuo (mais superficial) e o extrato córneo contínuo.
Esta região é constituída de células biologicamente inativas, que são continuamente renovadas (geralmente a cada 2 semanas no adulto), sendo substituídas por células provenientes das regiões mais profundas da epiderme.
Durante esta migração para a superfície, as células sofrem um processo de desidratação e de polimerização do material intracelular, que resulta na queratinização celular, ou seja, na formação de proteína filamentosa denominada queratina.
região gordurosa: é constituída de lípides provenientes, principalmente, da ruptura de lipoproteínas durante o processo de queratinização.
região lúcida: constituída de células vivas em fase inicial de queratinização.
região germinativa: local onde ocorre a formação das células da epiderme e também da melanina.
Na derme, que é formada por tecido conjuntivo, pode-se observar a presença de vasos sangüíneos, nervos, folículos pilosos, glândulas sebáceas e sudoríparas. Estes três últimos elementos da derme permitem o contato direto com o meio externo, embora não existem dados que demonstrem haver absorção através das glândulas citadas.
As substâncias químicas podem ser absorvidas, principalmente, através das células epidérmicas ou folículos pilosos:
Ø Absorção transepidérmica:
A absorção dos agentes químicos pela pele tem sua velocidade limitada pela região córnea da epiderme, mais precisamente pelo extrato córneo contínuo. As substâncias lipossolúveis penetram por difusão passiva através dos lípides existentes entre os filamentos de queratina, sendo a velocidade desta absorção indiretamente proporcional à viscosidade e volatilidade do agente. Já as substâncias polares, de baixo peso molecular, penetram através da superfície externa do filamento de queratina, no extrato hidratado. A absorção transepidérmica é o tipo de absorção cutânea mais freqüente, devido ao elevado número de células epidérmicas existente, embora não seja uma penetração muito fácil para os AT.
Ø Absorção transfolicular:
O número de folículos pilosos varia de 40 a 800 por cm2, o que representa apenas 0,1 a 1% da superfície total da pele. Sendo assim, esta absorção não é tão significativa quanto a transepidérmica. Algumas substâncias químicas podem penetrar pelos folículos pilosos, alcançando rapidamente a derme. É uma penetração fácil para os agentes químicos, uma vez que eles não necessitam cruzar a região córnea. Qualquer tipo de substância química, seja ela lipo ou hidrossolúvel, ionizada ou não, gás ou vapor, ácida ou básica, pode penetrar pelos folículos. É uma absorção também importante para alguns metais.
Ø Fatores que influem na absorção cutânea
São vários os fatores que podem influir na absorção através da pele. Geralmente eles são agrupados em quatro classes diferentes:
· Fatores ligados ao organismo:
Þ Superfície corpórea: a superfície corpórea total no homem é maior do que na mulher (média de 1,70 a 1,77 m2 no homem e de 1,64 a 1,73 m2 na mulher). Este fato pode aumentar a absorção transepidérmica no homem (maior superfície de contato com o xenobiótico).
Þ Volume total de água
corpórea: Quanto maior o volume aquoso corpóreo, maior a hidratação da pele e
consequentemente, a absorção pela pele. Quando comparado à mulher, o homem
possui maior volume aquoso total, extra e intracelular o que favoreceria a
absorção cutânea. Este fato deve ser considerado, também, quando se compara mulheres
grávidas e não grávidas. As gestantes apresentam maior volume aquoso corpóreo
e, em conseqüência, maior hidratação do extrato córneo. Isto possibilita maior
absorção cutânea de xenobióticos.
Þ Abrasão da pele: com a
descontinuidade da pele, a penetração torna-se fácil;
Þ Fluxo sangüíneo através da
peIe: estudos demonstram que, em média, 5% do sangue bombeado pelo coração
passa pela pele, em um fluxo em torno de 120 mL/kg/min. Inflamação ou fatores
que levam à hiperemia aumentarão a absorção cutânea. Um fato a ser considerado
é a gravidez. Durante a gestação ocorre alterações significativas no fluxo
sangüíneo das mãos (aumentam 6 vezes) e pés (aumentam 2 vezes). Esse aumento no
fluxo sangüíneo poderá influir na absorção cutânea de xenobióticos nas gestantes
expostas. Não foi detectada diferença entre o fluxo sangüíneo cutâneo de homens
e mulheres não gestantes. Um fator a ser considerado é a vascularização das
áreas expostas, uma vez que, quanto mais vascularizada a região, maior o fluxo
sangüíneo no local.
Þ Queimaduras químicas e/ou
térmicas: apenas as leves ou moderadas, já que as severas destroem totalmente o
tecido, formando uma crosta de difícil penetração;
Þ Pilosidade: nas áreas em
que existem pêlos, a absorção cutânea pode ser 3,5 a 13 vezes maior do que nas
regiões glabras;
· Fatores ligados ao agente químico:
Þ Volatilidade e viscosidade;
Þ Grau de ionização;
Þ Tamanho molecular.
· Fatores ligados à presença de outras substâncias na pele:
Þ Vasoconstritores: estes vão reduzir a absorção cutânea, devido à diminuição da circulação sangüínea.
Þ Veículos: podem auxiliar na
absorção, mas não promovem a penetração de substâncias que, normalmente, não
seriam absorvidas pela pele íntegra. Alguns veículos podem, também, absorver o
ar de dentro dos folículos e da mesma maneira aumentar a absorção
transfolicular.
Þ Água: a pele tem
normalmente 90 g de água por grama de tecido seco. Isto faz com que a sua
permeabilidade seja 10 vezes maior do que
aquela do extrato totalmente seco. O contato prolongado com água pode
aumentar a hidratação da pele em 3 a 5 vezes, o que resultará em um aumento na
permeabilidade cutânea em até 3 vezes.
Þ Agentes tenso-ativos: os
sabões e detergentes são substâncias bastante nocivas para a pele. Eles
provocam alteração na permeabilidade cutânea, mesmo quando presentes em
pequenas concentrações. Alteram principalmente a absorção de substâncias
hidrossolúveis, devido a modificações que provocam na estrutura do filamento de
queratina. Estes agentes tensoativos se ligam à queratina e com isto provocam a
sua reversão de a para b
hélice.
Þ Solventes orgânicos: estes
aumentam a absorção cutânea para qualquer tipo de agente químicos, pois removem
lípides e lipoproteínas presentes no extrato córneo, tornando-o poroso e menos
seletivo. Os solventes mais nocivos são aqueles com características hidro e
lipossolúveis. Destaca-se, como um dos mais nocivos, a mistura clorofórmio:
metanol (2:1).
· Fatores ligados às condições de trabalho (quando se tratar de exposição ocupacional):
Þ tempo de exposição;
Þ temperatura do local de
trabalho: pode haver um aumento de 1,4 a 3 vezes na velocidade de penetração
cutânea de agentes químicos, para cada 10oC de aumento na
temperatura.
Como citado anteriormente, o sexo e o estado gestacional podem alterar parâmetros fisiológicos importantes e, consequentemente, a intensidade da absorção cutânea (Tabela 2).
Tabela 2: Diferenças fisiológicas entre homens e mulheres que podem afetar a absorção de agentes tóxicos pela pele.
Parâmetro
|
Diferença
fisiológica
|
Diferença na
absorção
|
hidratação cutânea
|
> nas
gestantes
|
> absorção
|
área dérmica
|
> na
superfície corpórea homem
|
> absorção
|
espessura
dérmica
|
> no homem
|
< absorção
|
fluxo de
sangue/pele
|
> nas
gestantes
|
> absorção
|
Ø
Ação dos agentes tóxicos
sobre a pele
No contato dos agentes químicos com a pele podem ocorrer:
· Efeito nocivo local sem ocorrer absorção cutânea. Ex.: ácidos e bases fortes.
·
Efeito nocivo local e sistêmico. Ex.: o arsênio, benzeno, etc.
·
Efeito nocivo sistêmico, sem causar danos no local de absorção: é o
caso, por exemplo, dos inseticidas carbamatos (exceção feita ao Temik que é um
carbamato com potente ação local).
2.2.3) Absorção pelo trato pulmonar
A via respiratória é a via de maior importância para Toxicologia Ocupacional. A grande maioria das intoxicações Ocupacionais são decorrentes da aspiração de substâncias contidas no ar ambiental. A superfície pulmonar total é de aproximadamente 90 m2, a superfície alveolar de 50 a 100 m2 e o total de área capilar é cerca de 140 m2.
O fluxo sangüíneo contínuo exerce uma ação de dissolução muito boa e muitos agentes químicos podem ser absorvidos rapidamente a partir dos pulmões. Os agentes passíveis de sofrerem absorção pulmonar são os gases e vapores e os aerodispersóides. Estas substâncias poderão sofrer absorção, tanto nas vias aéreas superiores, quanto nos alvéolos.
2.2.3.1) Gases e Vapores
Ø Vias Aéreas Superiores (VAS)
Geralmente não é dada muita atenção para a absorção destes compostos nas vias aéreas superiores. Deve-se considerar, no entanto, que muitas vezes a substância pode ser absorvida na mucosa nasal, evitando sua penetração até os alvéolos. A retenção parcial ou total dos agentes no trato respiratório superior, está ligada à hidrossolubilidade da substância. Quanto maior a sua solubilidade em água, maior será a tendência de ser retido no local. Visto sob este ângulo, a umidade constante das mucosas que revestem estas vias, constitui um fator favorável. Há, no entanto, a possibilidade da ocorrência de hidrólise química, originando compostos nocivos, tanto para as vias aéreas superiores quanto para os alvéolos. Ex.: tricloreto de fósforo + H2O ® HCl + CO2; dióxido de enxofre (SO2) + H2O ® ® ® ácido sulfúrico.
Isto é importante
porque estes produtos formados, além dos efeitos irritantes, favorecem também a
absorção deles ou de outros agentes pela mucosa já lesada. Assim, nem sempre, a
retenção de gases e vapores nas vias aéreas superiores é sinônimo de proteção
contra eventuais efeitos tóxicos.
Ø Alvéolos
Nos alvéolos pulmonares duas fases estão em contato:
- uma gasosa formada pelo ar alveolar; e
- outra líquida representada pelo
sangue.
As 2 fases são separadas por uma barreira dupla: o epitélio alveolar e o endotélio capilar. Diante de um gás ou de um vapor, o sangue pode se comportar de duas maneiras diferentes: como um veículo inerte, ou como meio reativo. Em outras palavras, o agente tóxico pode dissolver-se simplesmente por um processo físico ou, ao contrário, combinar-se quimicamente com elementos do sangue. No primeiro caso tem-se a dissolução do AT no sangue e no segundo caso a reação química.
· Dissolução do AT no sangue
Deve-se, neste caso, considerar o agente químico como o soluto e o sangue como solvente. Em relação ao soluto, o fator que influi na absorção pulmonar é a sua concentração no ar alveolar (pressão parcial). Na verdade se estabelece uma troca de moléculas entre o ar alveolar e o sangue, no sentido do local onde a pressão parcial é menor. Assim, se a pressão parcial no ar alveolar for maior que no sangue, ocorrerá absorção e se for maior no sangue do que no ar alveolar, haverá excreção. É evidente, portanto, a importância de fatores ambientais, tais como temperatura e pressão, já que estes fatores vão influir na pressão parcial de gases e vapores.
Em relação ao solvente, deve-se considerar a constituição do sangue. Este tecido orgânico apresenta tanto uma característica aquosa (3/4 do sangue é água) quanto orgânica (proteínas, lípides, etc.). Sendo assim, mais do que a lipo ou hidrossolubilidade de um agente tóxico, deve-se aqui, considerar a sua solubilidade no sangue.
A importância deste fator surge de maneira mais evidente, quando se recorda que a duração do contato entre o ar alveolar e o sangue é de uma fração de segundo apenas. Então, para os gases e vapores que não estabelecem combinações químicas, apenas suas solubilidades no sangue assegurarão uma boa absorção pulmonar.
Uma maneira prática de se observar a solubilidade de uma substância no sangue é determinar o chamado coeficiente de distribuição (K). O coeficiente de distribuição (K) é expresso pela relação entre a concentração do agente tóxico no ar alveolar/concentração do AT no sangue, no momento em que se instala o equilíbrio. Alguns autores utilizam a correlação: concentração do AT no sangue/concentração do AT no ar alveolar, para avaliar a solubilidade da substância.
Então um coeficiente baixo, ou seja denominador alto, implica em uma boa solubilidade no sangue e isto conduz a uma concentração elevada do agente neste meio. No entanto, justamente devido a esta alta solubilidade, a saturação sangüínea será lenta, a retenção do agente neste local será mais longa e a transferência aos tecidos tardia. Quando o coeficiente de distribuição é alto, os fenômenos inversos acontecem. Assim o K permite avaliar a concentração do AT no sangue conhecendo-se sua concentração no ar alveolar.
Pode-se observar que dois fatores foram destacados até aqui: a pressão parcial do gás ou vapor e sua solubilidade no sangue. Não foi considerada a presença das membranas alveolares e capilares interpostas entre o ar e o sangue.
Isto porque estas membranas tem espessura muito pequena (cerca de 1m) e superfície muito grande, não representando um obstáculo à absorção das substâncias químicas. Se o agente tóxico tem pequeno tamanho molecular e boa solubilidade no sangue, poderá ser absorvido pelos pulmões.
É importante considerar também fatores fisiológicos, tais como a freqüência cardíaca e respiratória, que podem aumentar ou diminuir a saturação sangüínea e consequentemente a absorção. A influência destes fatores difere de acordo com o tipo de substância analisada. Assim, para substância de K baixo, ou seja, muito solúveis em água, o aumento da freqüência respiratória favorecerá a absorção.
Já para a substância de K elevado (pouco solúvel no sangue), a absorção será favorecida pelo aumento na freqüência cardíaca. Importante ressaltar que, no caso do sexo feminino, o estado gestacional pode alterar esses parâmetros fisiológicos e, em conseqüência, a intensidade da absorção pulmonar (Tabela 3).
Tabela 3: Diferenças fisiológicas entre mulheres gestantes e não gestantes, que podem afetar a absorção pulmonar de agentes tóxicos.
Parâmetro
|
Diferença
fisiológica
|
Diferença
na absorção
|
função pulmonar
|
> nas
gestantes
|
> exposição
pulmonar
|
rendimento
cardíaco
|
> nas
gestantes
|
> absorção
|
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